27 de setembro de 2012

É assim que eu gostaria de poder te olhar



Quando a hora certa chegar, é exatamente desse jeito que eu gostaria de poder te olhar. Eu vou querer te ver depois de um dia cansativo de trabalho, porque ver quem faz bem acalma e melhora. Estou naquela fase dos vinte e poucos anos em que você tem a sensação de que as coisas estão um pouco fora dos eixos e que ser adulto não tem tanta graça assim.

Eu acho que te amo porque tenho vontade de cuidar de você e saber como as coisas estão. Eu acho que te gosto, porque só de te ver chegando no fim da rua já provoca qualquer coisa em mim que não sei dizer ao certo. Sempre tive essa correria e todo esse nosso negócio de querer ser feliz lá na frente, e já perdi a conta do número de vezes em que fiquei pensando em tudo o que tinha para fazer no dia seguinte e não no que ainda estava acontecendo. Eu sei que sempre me preocupei demais com a felicidade que quero ter amanhã, mas quando você viajou para o outro lado do mundo e ligou a webcam só para me fazer rir, eu percebi o quanto já estou sendo feliz agora. De repente eu descobri que estou sendo muito mais feliz hoje do que achei que poderia ser em qualquer dia seguinte.

Apesar de prepararmos surpresas um para o outro de vez em quando, os momentos mais bonitos e intensos acontecem quando não esperamos.  Antes eu achava que uma prova de amor tinha a ver com grandes gestos e exposição, agora não. As expressões mais bonitas e significativas que existem são simples. Flores são doces, mas murcham três dias depois. As nossas lembranças e coisas que só a gente tem sobreviverão há um bom número de estações.

A gente só percebe que existe sentimento com o tempo, ou com algum tipo de contratempo que nos tire da zona de conforto habitual. Quando a vida realmente decidir nos dar um daqueles momentos que nos tiram dos eixos, é exatamente desse jeito que eu gostaria de poder te olhar.

Ordinary Girl by Waz on Grooveshark



21 de setembro de 2012

Ana

Eu poderia dividir a minha vida em duas etapas: antes e depois de Ana. Embora Ana nunca tenha sido um grande amor na minha vida, ela ainda era o exemplo que eu usava para falar de sentimento. Eu não lembro dos meus caminhos antes de Ana, nada se compara ao dia em que vi a menina dos cabelos encaracolados andando de bicicleta na minha rua. Era Ana, menina-bonita-moleca-sorridente. Era Ana entrando na minha vida, simplesmente.

Lembro de quando a encontrei saindo do trabalho e conversamos sobre as primeiras emoções da nossa adolescência. Não contei a menina-bonita-moleca-sorridente que a primeira emoção que senti foi por ela.  Aliás, eu nunca contei nada a Ana. Nunca deixei explícito que ela era a minha menina, até mesmo quando a escutava contando histórias sobre o garoto dos olhos bonitos que olhou para ela. Eu não era o menino dos olhos bonitos de Ana, aliás eu nunca fui, mas ainda sim era quem seria capaz de passar uma vida inteira olhando para ela.

Até o dia em que viajei e conheci as montanhas. Coloquei a mochila nas costas e me dei ao luxo de trilhar um caminho sem rumo e sem planos depois de ter escutado de Ana que não estávamos preparados, que precisávamos conhecer a vida. Logo a menina sorridente que me transformou naquele primeiro beijo, logo a bonita que eu encostei na parede e disse tudo o que sentia, logo a boneca que se desencantou depois de um certo tempo. Aproveitei que Ana foi estudar no exterior e coloquei o pé na estrada. Fiz amizade com um louco sem dinheiro algum no bolso que queria conhecer o mundo, mas não pode chegar ao topo dele. Ele estava cansado de andar por aí com aquele vermelho extravagante fingindo ser quem ele não era. Continuei o meu percurso em direção ao meu lugar preferido na terra. Eu queria ter o mundo inteiro nas mãos para fugir do fato de Ana ter dito que eu não estava pronto. E, só até certo ponto, eu não estava mesmo. 


Se eu pudesse inventar algum tipo de verdade, eu diria que um homem só se torna homem depois que escala uma montanha. A gente aprende que é preciso continuar escalando mesmo após algumas quedas, mesmo com as dores nas pernas e uma outra série de coisas. Quando você chega ao ponto mais alto, você se torna pronto para qualquer outra montanha na vida, não importa o tamanho que ela tenha. Superando toda a dificuldade da escalada, a gente encontra uma vista linda, algo que te faz acreditar que qualquer coisa é possível nessa estrada e qualquer erro que você venha a cometer é pequeno perto da imensidão que existe para te dar a oportunidade de consertar. Naquele dia eu estava pronto para tudo. Para o bom, para ruim, para a vida e para Ana. Acho que todos nós deveríamos encontrar o nosso lugar preferido na terra, não importa onde nos encontremos.

Voltei. A transformação pessoal que tive durante todo o ano em que viajei não se compara ao minuto em que me tornei outro por não ter encontrado Ana. Ouvi dizer que ela já não era sorridente e tentei descobrir se tinha algo a ver com os problemas familiares que ela costumava disfarçar tão bem ou com o os arranhões que havia sofrido no coração. Lembro que ela carregava o mesmo sorriso quando parti. E ainda me fez prometer que eu voltaria, que não me deixaria levar pela curiosidade de outras terras, outros gostos e outros mundos. Sei que quando algumas coisas não dão certo, surgem aqueles restos de mal entendidos e se eu fui algum tipo de arranhão para Ana, tenho certeza que fui o único machucado doce daquela menina. Doce, porque é aquele que não traumatiza, que não mancha o carinho  ou o afeto, e que acontece às vezes entre duas pessoas que não sabem lidar muito bem com essa coisa de sentimentos. A gente precisa amadurecer um para o outro às vezes. É por isso que duas pessoas conseguem passar anos uma ao lado da outra e só vão se apaixonar lá na frente. É por isso que a gente toma pancada e entorta, leva "chapuletada" e endurece, se apaixona e amolece. Essa coisa de a tampa certa da panela é balela, coisa do tempo dos avós. Hoje em dia, a gente passa por uma série de experiências para aquetar alguma agonia no peito e depois vai se entortando para encaixar em outra tampa. Arrumar nossas elevações para cabermos em alguém, isso é amor pra mim também.


Acontece que a menina-bonita-moleca-sorridente virou mulher e a vida lhe pareceu algo injusto, algo pesado demais para alguém como Ana. Na minha opinião, a menina dos cabelos encaracolados que andava de bicicleta na minha rua tinha muitos medos e ninguém para se agarrar. Se eu pudesse, teria levado Ana até as montanhas. Teria ensinado a menina que mudou a minha vida, mas não pôde ser o meu grande amor, que as coisas podem ser ser pesadas assim mesmo. Mas, que a vista no final seria linda se ela encontrasse uma boa companhia para continuar andando. Alguém que fosse capaz de se encaixar às partes entortadas que a vida te deu e às endurecidas que ela te impôs. Eu poderia ser o par de Ana, eu poderia lhe dar a mão, lhe cantar aquela canção. Eu poderia tanta coisa se você tivesse deixado Ana, aliás eu poderia tanta coisa se você tivesse ficado.

É uma pena você não ver o mundo daqui de cima menina, mas acredito que você tentou chegar aonde pôde. Quando digo que você não é o meu grande amor é porque ainda não vivi todos os amores necessários para saber qual é o maior, embora tenha alguma ideia. Ninguém conseguiu chegar dentro de mim como a menina  dos cabelos encaracolados que se interessou pelo meu machucado no joelho e decidiu fazer medicina. Só Ana, mulher-linda-frágil-não-tão-mais-sorridente que se afastou e me tirou a oportunidade de estar aqui quando ela precisasse. Se você tivesse sobrevivido, eu poderia ter te trazido comigo. As coisas poderiam ser diferentes e você poderia apenas aprender que levantar no dia seguinte, mesmo sem muita vontade, é seguir em frente. Você deveria ter me aceitado quando ainda era menino Ana, simplesmente. Eu teria ficado,  sim, até se você exigisse que fosse eternamente.

"Se ela tivesse sobrevivido, poderia ter vindo para cá comigo, 
talvez eu pudesse ter dito algo a ela, ter feito com que ela se sentisse de outro jeito
Talvez eu só fizesse amor com ela e não dissesse nada."
Kerouac em  Os vagabundos Iluminados


20 de setembro de 2012

Balões de água discretos que não sabem esvaziar

Sou o tipo de pessoa que não solta o choro às vezes, é como se eu sentasse na cadeira e sentisse um balão dentro do peito se enchendo. E eu sei que é o choro que quer sair, mas não sabe como, porque quando ele tentou ir embora eu estava no meio daquelas pessoas e o prendi. Quando ele quis cuidar de mim, eu disfarcei e o deixei acumular.

A primeira coisa que faço para manter o choro preso é me distrair. Foco no projeto que preciso entregar no dia seguinte, dou um pulo rápido no banheiro para evitar as gotas pulando para fora e disfarço indo pegar algum copo de água. Se eu conseguisse pelo menos chegar em casa antes do balão estourar já seria ótimo, mas às vezes não dá. Esses dias eu fiquei pensando se as pessoas que choram no metrô se sentem mais confortáveis no meio de desconhecidos, do que no escritório com os colegas de trabalho durante mais um dia aparentemente normal. Aparentemente normal.

O ruim de tentar se distrair é que quando você realmente pode esvaziar, o negócio que estava pesando no peito não vai embora. É como se os nossos balões precisassem de plateia e a gente não soubesse, e é como se o corpo ainda estivesse acostumado a ganhar o mesmo tipo de colo e carinho que recebia quando chorávamos na infância. Há algo incômodo por dentro e nada explica ele não querer esvaziar quando a gente quer ou pode.



O problema de balões que enchem e não sabem esvaziar é que eles estouram de repente. Você sabe disso quando vê lágrimas caindo no meio do nada ou no meio de todo mundo. Às vezes a gente não precisa nem chorar quando elas vazam sem inundar nenhum tipo de poro ou passar por alguma camada de pele. As gotas apenas começam a cair uma por uma bem em cima do estômago, de um jeito que qualquer alimento ingerido provocaria um acidente, de um jeito que a gente só consegue se controlar ficando quieto e sério. Balões cheios por dentro não podem encontrar espaços para fora. Se abrirmos a boca, o ar já ameaça faltar. Se alguém chegar mais perto, o corpo já pede colo.

Quando você sente um balão enchendo e não quer soltar é uma agonia enorme. Uma agonia que você despreza com todas as forças para ela ir embora e voltar mais tarde. Balões cheios são perigosos, pesam no peito, no corpo e de um jeito que às vezes mal dá para andar. Hoje há um balão sozinho dentro de casa que não sabe esvaziar. É como se ele quisesse algum tipo de plateia e sozinho no espetáculo, desistisse de se apresentar. É como se o corpo sentisse falta de algum tipo de balanço parecido com o que recebia na infância quando começava a chorar. Ou talvez ele só esteja me castigando por eu não ter deixado ele ser frágil, por eu ter me feito de forte e não ter deixado ele se soltar. Por eu ter esquecido que ele era humano no meio de todos aqueles humanos que também carregam balões de água e os forçam a ser discretos, como se existisse uma hora certa para esvaziar.

15 de setembro de 2012

A gente bebe e fica afim de dizer eu te amo

E eu me pergunto por que aquelas primeiras duas horas na mesa nos deixam tão vulneráveis a pegar o celular e ligar para algum ex? Por que eu não aproveito as segundas insuportáveis do metrô lotado para xingar, ou até mesmo dizer "Amor, volta. Essa vida maluca de trabalho pesado é horrível sem você". Por que não faço isso quando estou lúcida?

Meu amigo chega e bate na porta. "Luana, me dá esse telefone. Não liga para ele, hein?". Tarde demais, já disquei o número. A coisa mais difícil do mundo é ter um amigo paquerador que cuide bem do seu celular. Aproveitei a primeira loira que passou, peguei o aparelho na mesa e saí andando e trombando em todo mundo para ligar para o meu último cara, o meu último alguém... peraí, ele não é mais meu.

E enquanto ele demora para atender, eu só fico pensando no que vou dizer. Me seguro para não chorar e me arrependo de ter exagerado na vodka. Espera, eu nem sei o que estou pensando direito. Por que ele não me atende? Quem demora para atender um celular às 3h45 da manhã? "Luana, para com isso, volta para a pista. A balada está cheia de cara para você". Eu sei amigo, mas ele sabia como conversar comigo. Ele chegava debochando de alguma coisa e falavamos por horas sobre vários assuntos, e nunca cansava, nunca. Ao contrário desses caras querendo cochichar no meu ouvido por causa desse som alto. E não, não vou para nenhum lugar mais calmo. Ok, eu sei que ele é um idiota. Tá, eu sei que mereço alguém melhor. Para de falar que ele atendeu.

"- Alô, tá me ouvindo direito? Tudo bem?
- Tudo sim e aí?"

E aí que eu disse eu te amo enquanto ele disse que eu ia ficar bem. Eu disse eu te amo enquanto ele quis saber onde eu estava, com quem eu estava e se eu tinha alguém para me levar para casa. Eu disse que o amava enquanto ele dizia que essas coisas iriam passar, que era muito recente, que já tentamos bastante e tentar de novo só iria nos machucar. Mas ele disse que eu significava muito para ele, que eu fui importante. Fui importante?

Ele sempre foi o mais racional. Ele sempre foi a cabeça pensante e eu a sonhante. Costumávamos dizer que a gente se completava, mas é preciso ser muito mais do que uma metade para fazer um relacionamento dar certo. Somos todos inteiros e não existe ninguém pela metade. A gente tem que tirar esse negócio da cabeça de que vai encontrar alguém totalmente perfeito ou que seremos a perfeição de alguém. Ou que quando acaba um relacionamento, não encontraremos mais ninguém. Além disso, ele usou "fui", no pretérito perfeito mesmo. Não existe amor no pretérito perfeito. Só quem quer seguir em frente é que usa o pretérito perfeito.  E aí que discutimos novamente e eu desliguei depois de dizer "Ninguém nunca vai te amar e ser tão legal com você como eu fui, 'tá me entendendo?".

Não sei se a minha ligação fez efeito, não sei nem se vai mudar alguma coisa eu ter conseguido desabafar o que sentia. Mas, eu explico ao meu amigo que aqueles três copos de bebida são os culpados pelo lapso de loucura que tive e peço desculpas por ter sido grossa com ele. Sim, você está certo, ele me machucou e nunca me mereceu. Sim, ele era um idiota e eu não sei porque ainda me sinto mal. É verdade, é melhor eu desligar esse celular.

E enquanto eu desligo o celular, eu fico pensando que meu amigo estava certo desde o começo. E se eu não tivesse ligado, eu não estaria nem um pouco com a sensação que estou agora. O meu ex poderia até estar pensando que estou bem, que me recuperei e estou me divertindo, ao invés de saber pela minha boca que ainda gosto dele. E não faço essas ligações no metrô lotado, porque nele sei o quanto não deu certo e o quanto foi difícil terminar. Nele eu sou menos impulsiva e mais racional até. A gente bebe e fica com vontade de dizer eu te amo, mas não é só isso. A questão é que a gente se toca que o ex é um idiota, mas é um idiota por quem a gente sente alguma coisa. É um imbecil, mas é um imbecil com quem a gente se importa. Existem muitas outras pessoas legais por aí sim, mas nenhuma delas me faz ter essa saudade ou me faz sentir o que aquele idiota me fazia. E agora?

E agora é que meu amigo vai ter que esquecer essa morena. Amigo, pega meu celular de novo e vê se cuida dele direito. Esconde isso e não me devolve nem que eu implore! Me leva para dançar, me faz esquecer disso. Não não, senta aqui e me dá colo. Eu bebi, e tô com vontade de dizer eu te amo. Não deixa.


6 de setembro de 2012

Cicatrizes


Você pegou a minha mão e perguntou de uma cicatriz que tenho e que já está há tanto tempo comigo que eu quase nem noto que ela existe. Sei que foi na infância e que teve alguma coisa a ver com o ferro de passar, mas não sei o que aconteceu e nem lembro da recuperação. Após isso, conversamos sobre outras duas cicatrizes que também perderam a história que tinham para contar, mas que estiveram na pele durante todo o tempo.

Foi aí que eu percebi que adquiri machucados que cicatrizaram e ficaram no meu passado de um modo que eu não os percebo frequentemente. Observando bem atentamente as minhas mãos, eu encontrei a cicatriz do plástico derretido que caiu no dedo, a mordida do cachorro na casa da amiga, o grafite da lapiseira do melhor amigo que nunca saiu e a marca de ferro que até hoje me ajuda a descobrir qual das minhas duas mãos é a esquerda. Sem contar todas as treze vezes que fiquei com algum tipo de gesso. Sim, treze.

Quando eu conseguia enganar a minha mãe, eu era o tipo de menina moleca que brincava de pega pega descalça na rua da avó, que subia no pé de goiaba para comer fruta, gostava de procurar tatu-bola na terra, mas não conseguia manter a pipa lá em cima. Na adolescência, eu era o tipo de garota moleca que jogava basquete com os meninos, não sabia muito sobre essa coisa de maquiagem ou  beijo na boca, mas aprendeu a andar de skate só porque se apaixonou por alguém.

Durante todos esses anos eu adquiri machucados que cicatrizaram e acredito que só ficaram no meu passado, porque eu parei de olhar para eles e lembrar de como me machuquei. Observando bem atentamente as minhas mãos, eu descobri que caí o suficiente para encontrar diversas marcas nelas, mesmo que uma boa parte delas tenha fugido da memória. Apesar de ainda existirem na pele, elas foram embora de um jeito que eu quase não lembro da dor. Sei que ela existiu, tenho uma ideia de como foi, mas isso não me afeta mais.

Quando eu consigo enganar meu medo, eu sou o tipo de garota-menina-moleca-mulher que brinca de pega pega na vida e se esconde do asfalto para pisar descalça na grama. Claro que não tenho mais a facilidade de subir em árvores, mas nunca me importei com a dificuldade que seria necessária para "comer a fruta do pé". Já sei lidar com essa coisa de maquiagem, mas às vezes sinto aquele frio na barriga do beijo. E continuo aprendendo muitas coisas ao me apaixonar por alguém.

Você prestou atenção nas minhas mãos e fez eu descobrir que todas as nossas dores vão embora algum dia. A gente até ri de algumas delas mais tarde, mesmo sabendo que quando elas apareceram nós choramos, fizemos cena e pedimos colo para a mãe. Claro que eu passei a tomar mais cuidado com os ferros de passar e com os animais de estimação dos meus amigos. Mas, em momento algum eu deixei de brincar com algum deles ou de passar a minha roupa. A questão é que eu descobri que é preciso aprender a cativar qualquer animal de estimação antes de me aproximar. É necessário chegar com jeito, devagar e com carinho nos cães, porque eles podem se assustar e te morder para se proteger, mesmo que você só queira lhe fazer um afago.

Um dia, qualquer dia, alguém vai pegar nas suas mãos e perguntar sobre as suas cicatrizes. E então você vai refletir se vale a pena se proteger tanto da vida depois de tantas marcas que passaram. A gente se machuca para aprender a deixar de se machucar, só isso.
Pode ser que você tenha apenas uma vaga lembrança sobre a história das suas marcas, talvez você até fale sobre o assunto sem sentir dor alguma, e quem sabe as suas cicatrizes até te ajudem a levantar no dia seguinte. A gente também se machuca para aprender a descobrir um jeito diferente de seguir em frente.
E se ainda existir dor em alguma das suas feridas, você receberá o afago de quem se interessou em ouvir  e saber sobre elas, porque cicatrizes também existem para nos ensinar a cuidar de um machucado que nem é da gente.

1 de setembro de 2012

Carta 21: blusa amarela, saia, tênis e abraço

Antes de começar a escrever eu pensei no quanto eu teria que agradecer a Deus por você estar comigo. Fiquei imaginando o quanto ele foi costurando todos os acontecimentos da minha vida e te colocando por perto para me deixar bem, para me falar Dele e me acalmar com aquele seu abraço leve que traz calma.

 E começando a escrever, eu percebi o quanto eu devo te agradecer por ter estado por perto e por ter estado comigo. Eu tenho uma admiração, um afeto e um carinho enorme por você. Sei um pouco da sua história e descobri a sua mania de falar em silêncio. Até mesmo quando nós nos abríamos uma para a outra.
Lembra no começo da faculdade que você se sentia sozinha e eu disse que se você fosse para a esquerda eu iria também? Pois é, vai ser sempre assim.

E eu quero que eu estarei aqui até mesmo se você quiser conversar em silêncio ou só precisar de um abraço. Me lembro daquele dia em que cheguei na faculdade com a maior dor de cabeça do mundo e você saiu da sala de informática dizendo que só queria me dar um abraço. Te vi voltar para o computador com aquela sua blusa amarela, saia preta, meia de bolinhas e all star. Nunca vou esquecer o quanto o seu gesto significou para a dorzinha que eu tinha no peito.

Não importa o quanto eu escreva, não sei se conseguirei expressar tudo o que quero ao certo. Muito menos o quanto eu o quanto eu te admiro e nem o quanto eu quero te ver feliz. Nós temos os nossos medos, nossas dúvidas e sempre terminamos nossos almoços com confissões e reflexões. Mas eu sinto que de alguma forma, vamos passar por essa vida de um jeito extraordinário. Você é uma pessoa incrível, e eu tenho certeza que Deus te olha com ternura todos os dias. Meu coração teve seu carinho sempre que precisou, e eu nunca vou esquecer disso.

De uns tempos para cá eu parei de dizer eu te amo toda hora e para qualquer um. Banalizaram o significado disso e eu percebi que é muito fácil dizer quando não se sente. Mas, a questão é que até agora eu escrevi todas as palavras do mundo e não consegui me expressar totalmente. Então.. eu te amo muito, e falo isso que é para transparecer que você é uma das pessoas do meu mundo tão cheio de segredos, intimidades e verdades. Um mundo que é só meu, que pouca gente sabe ou entra. E você entende o que eu quero dizer.

Obrigada por tudo e conte sempre comigo, porque se você for para a esquerda, eu irei também.

postagem editada de carta escrita em 2011