28 de maio de 2013

Sementes de Pé de Manga Espada

All You Need Is Love by Playing For Change on Grooveshark

Existe um museu na Croácia chamado "Museu dos Corações Partidos". Criado em 2006, ele expõe  objetos de relacionamentos que não deram certo, bem aqueles que a gente ganha quando está envolvido com alguém e não sabe muito bem o que fazer quando tudo acaba. O que começou com 70 peças, hoje tem mais de mil. Existem mais de mil pessoas com o coração partido no mundo, muito mais.

Os donos do museu, que namoraram de 1999 a 2003, criaram o espaço exatamente por esse motivo: o de não saber o que fazer com todas as coisas que ficaram do relacionamento que não deu certo. Ao longo dos anos, diversas pessoas de coração partido foram contribuindo  com o acervo do museu. Há a vasilha d'água     representando as lágrimas derramadas, a cueca, as algemas cor-de-rosa, o ursinho, a camiseta vermelha, o molho de chaves e até mesmo um machado e um anão de jardim sem nariz. Os objetos expostos tem data de início e fim do relacionamento, além de uma breve história por trás do seu significado. Todos eles foram doados ao  "Museu dos Corações Partidos" representando o fato de que cada um tem o seu jeito de partir e se despedir.

Machados também sabem falar de amor
Tem esse curta-metragem chamado "O céu no andar de baixo" sobre o menino Francisco, que era apaixonado pelo céu e ao longo do anos descobriu que tinha apenas duas opções na vida: só poderia olhar para baixo ou olhar para cima. Por uma questão de "sobrevivência" ele optou por olhar para baixo a fim de evitar quedas e outros problemas durante o caminho. Aos doze, ele ganhou uma máquina fotográfica e desde então passou a fotografar o céu fazendo uma comparação à expressão das pessoas. “Há um céu para cada quando”, é.

E aí que em uma das suas fotografias a vida tomou um outro rumo e o levou a escutar as reflexões de um pé de manga espada sobre o amor. Compreendeu que qualquer árvore nesse mundo é exatamente igual a gente: cheia de folhas sorrindo para o sol e, ao mesmo tempo, com enormes raízes cobertas de segredos e coisas íntimas que só são vistas se cavarem fundo, e muito fundo. Concluiu ainda que o pé de manga espada é exatamente como todo o amor: cresce cheio de frutos e deixa enormes raízes dentro de nós.

"O Céu no Andar de Baixo"
Assim como o Francisco, eu fiquei pensando que todo mundo tem uma série de tocos e objetos ao longo do caminho, e que talvez o amor tenha mesmo esse processo que a árvore diz. Eu concluí que quando a gente para pra analisar tudo isso, vem aquela sensação de que é perigoso deixar qualquer coisa se enraizar. Por isso hesitamos diante das "sementes distraídas que aparecem ao acaso", e estão vindo logo ali para crescer de alguma forma. Às vezes eu acho que é melhor nem pensar nessa parte obscura que ninguém vê. Olhar para cima também é uma questão de sobrevivência, até mesmo quando não há mais folhas e flores para contar. As árvores são responsáveis por uma boa parte do respiro limpo do nosso mundo... novos pés de manga espada também.

Talvez passar pelo processo de crescimento de um novo sentimento sem pensar nos tocos, "podas" e objetos deixados para trás também seja uma questão de sobrevivência nossa ou do amor, sei lá. Cada um tem o seu jeito de partir e recomeçar. Existem mais de mil pessoas querendo ir ao encontro de um pé de manga espada no mundo, muito mais.

Letícia Cardoso

15 de maio de 2013

Outro texto sem destino

um texto para os meus amigos
Tempo Perdido by Legião Urbana on Grooveshark                                              

Estamos todos virando adultos. É, e não tem volta. Não esqueço daquele texto do Bernardo Biagioni se perguntando "Para onde estamos indo?" após seus três anos de profissão e de estrada. Estou nos meus primeiros meses de jornalismo, no trânsito às nove da manhã, nas trinta e algumas poucas horas a mais de trabalho por semana, nas peças de teatro, no "happy hour" com o pessoal do trabalho, nas festas dos amigos do colégio, no cinema em plena terça-feira e em todo lugar sem cansar de me perguntar: Para onde nós todos estamos indo?



E não é só comigo. É com o meu amigo radialista, a menina que quer trocar de curso e com o o cara que acabou de começar o TCC. É com o menino perdido em outra cidade e querendo voltar, com o que largou tudo para fazer um mochilão, com o que foi morar em Ipanema e "Nossa Lê, eu tô a-do-ran-do!". Essa dúvida também está batendo naquele que comprou o carnê do INSS, porque ainda não arranjou emprego fixo, com o que começou a pagar o empréstimo que fez no banco e também com o que reclamou do fato de precisar declarar o imposto de renda no ano que vem.

Na turma dos que se perguntam para onde estamos indo tem quem inventou uma desculpa e faltou no trabalho para emendar o feriado, tem o que não quis perder tempo e emendou a pós. Tem quem decidiu entrar na academia, começar a terapia, fazer um curso de cinema, trocar o guarda-roupa, virar blogueiro, criar um podcast, ter uma coluna no blog nerd e comprar o Iphone 5. Tem quem largou o jornalismo, a matemática, a engenharia de alimentos, o turismo e decidiu prestar o vestibular mais uma vez. Não tem ninguém querendo virar escritor, perder a melhor festa do ano, não conhecer uma garota legal ou perder o contato com o cara engraçado do trabalho.

São todos os meus amigos e estão todos indo para algum lugar. Ninguém sabe de verdade o que está acontecendo, mas todo mundo desconfia: estamos crescendo e estaremos sempre. Não sabemos para aonde exatamente o futuro vai dar, mas continuamos vivendo e sendo empurrados por essa vontade de ser feliz e ter coisas bonitas para contar.

Isso porque parar agora não vale e desistir agora não dá, nós todos caímos nesse presente incerto e acabamos de começar. Respirar fundo e decidir continuar seguindo em frente vai fazer toda a diferença no caminho, você vai ver. Mesmo sem saber com quem, fazendo o que, quando, onde, como ou por que.

Estamos todos virando adultos e eu tenho medo de ver alguém se cansar, desistir e decidir parar com tanta vida esperando o desenrolar da nossa história. É clichê dizer que a gente tem que tentar ser feliz? É, e não tem volta. Mas tudo bem,  ninguém se importa.

Letícia Cardoso