30 de dezembro de 2012

Eu e os textos mais importantes do ano

Coldplay Paradise Official Video by Coldplay on Grooveshark

Comece com "The love inside, you take it with you", que ficou dois anos e meio na gaveta antes de ser publicado aqui.

Escrever me ajudou a ser sincera com os meus sentimentos e conseguir falar sobre isso também. Mesmo assim, eu ainda sim fico sem palavras durante algumas situações. "Eu não ia dizer eu te amo" durante vários  momentos, principalmente porque às vezes eu acho que digo demais e não sei se todo mundo sabe o que ser amado significa. Só que eu não consigo fugir da necessidade de pedalar e ir em frente, até mesmo quando estou com medo.

A questão é que eu descobri que, mais do que tudo nesse mundo, a gente não pode ficar se protegendo totalmente da vida por causa das experiências antigas. Eu perdi muito quando fiz isso, e demorei para perceber que as "Cicatrizes" não existem para que tenhamos medo, e sim para fazer a gente seguir em frente sabendo que vai conseguir superar o próximo machucado. Se for necessário, sobreviverei certo? Certo. Agora, vamos lá viver.



Eu descobri usando "O lado esquerdo e direito do abraço" que você precisa encontrar a sua turma, descobrir quem está por você e guardar essa pessoa com toda a preciosidade existente no mundo. Elas são raras e existem para ficar ao seu lado para qualquer coisa da vida, até mesmo para refletir sobre a "Liberdade, o séc XXI e a Solidão" em uma mesa de bar. Eu sou tão amiga da minha pessoa que eu tenho certeza que não nascemos irmãos por uma pequena distração do destino. Então cara, muito obrigado por tudo. Mesmo.

"Carta ao irmão com autismo". era para ser apenas mais uma carta na "Caixa de Correspondência", mas foi parar no Papo de Homem. Acho que foi um dos meus grandes acertos, já que tenho certeza absoluta de que a minha personalidade e o modo como eu enxergo a vida teve uma enorme influência do que eu aprendi ao longo dos anos com o Igor, e colocar isso para fora foi sensacional. Não consegui dar continuidade ao blog por causa do ano corrido que tive, e sei que mereço um puxão de orelha por causa disso. 

Gostaria de agradecer a todo mundo que comenta, dá a opinião sobre os textos ou manda emails. Foi em um email durante a madrugada que nasceu o "Era pra eu ser só mais uma garota no bar", sobre dias que a gente acha que não serão importantes e por algum acaso da vida se tornam especiais. Então, obrigada pela recíproca de todo mundo. Eu também me identifico com vocês.

E como a maior parte desse blog é sobre sentimentos, eu desejo que você vá atrás dos seus em 2013 sem medo algum. Tudo bem ser até daquele jeito meio desconcertado de quando "A gente bebe e fica afim de dizer eu te amo", mas é importante sempre dizer o que quer dizer, e arriscar. Eu acredito muito nisso. "Você já foi um espermatozoide mais inteligente", por que fazer diferente agora? A gente acaba perdendo uma série de oportunidades achando que existe uma hora certa. Minha vida pode mudar às "23h12", quem sabe?

E se você ainda tiver medo "Tome um pé na bunda e diga: obrigado!", depois é só seguir em frente. Um dia o coração descansa e a gente passa a entender o que é o Paraíso na terra.

Um beijo e Feliz 2013 pra todo mundo.


15 de dezembro de 2012

O que você vai fazer com o que resta da sua vida?

say what you need to say by John Mayer on Grooveshark
Escutei que o mundo iria acabar três vezes nos últimos vinte e um anos. Lembro até que na segunda série eu desenhei nuvens carregadas e portões dourados na lousa, e me despedi de todos os meus amigos da sala pedindo que me esperassem na porta do paraíso. No outro dia, acordei e tive que ir para a escola novamente. 

E agora há uma nova data para o fim do mundo, segundo o calendário Maia, Nostradamos e as pessoas do metrô. Do ponto de vista religioso, escutei sobre o apocalipse e o fim da existência de espíritos extremamente sem luz. Deus aparecerá e vai dar um abraço em todos aqueles que fizeram coisas boas na terra, além de analisar os pecados de cada um. Não haverá mais psicopatas, assassinos em série, entre outras coisas que só vamos saber após o dia 21 de dezembro. Além disso, Jesus vai nascer novamente e será brasileiro. É o que dizem.

Não me preocupo muito com o fim do mundo, na verdade isso pouco me interessa. Mas, acho bom inventarem todas essas datas para que as pessoas tenham essa sensação de finitude, de que tudo pode acabar sem que elas tenham dito o que precisavam dizer ou fazer o que elas precisavam fazer. Essas coisas são boas para nos lembrar do que realmente importa. Eu apostei com o meu melhor amigo o que faríamos se o mundo acabasse e ele me prometeu que bateria na porta da garota dele e daria um beijo, mesmo sem saber se ela corresponderia. Fim do mundo, o que a gente é capaz de fazer pensando que não haverá um dia seguinte?




Não estou julgando o que as pessoas estão dizendo e peço desculpas a Nostradamus se eu o ofendi. A questão é que a gente não tem que ter medo ou colocar em evidência todas essas previsões finais, principalmente porque as coisas podem acabar agora mesmo, ou amanhã de manhã enquanto você toma um suco de açai. Eu acho que o mundo pode acabar de muitas maneiras sem a existência de uma profecia para isso, acho até que o (seu) mundo já acabou várias vezes e você continuou vivendo. O apocalipse vai acontecer sem aviso algum e não vai ser como dizem. Aliás, eu não sei se acredito que as coisas serão como dizem.

Talvez você não concorde comigo, talvez tudo o que eu escrevi seja apenas um ressentimento pelo o que passei na infância quando as pessoas me falaram que o mundo iria acabar e ele não acabou. O ponto é que eu sei desde a segunda série que o mundo não precisa acabar para eu dizer aos meus amigos o quanto eu gosto deles ou fazer qualquer outra coisa que eu tenha vontade de fazer, que eu me incomodo quando as pessoas ficam esperando por aquele "momento certo", que talvez não chegue.

Por isso, se o mundo não acabar em 2012, que a gente pelo menos queira ser um pouco melhor e aprenda que é possível encontrar o paraíso na terra, é mais fácil quando a gente escolhe viver, dizer e fazer o que tem vontade. E mesmo que acabe, ainda temos alguns dias para ir na casa das nossas pessoas e simplesmente beijá-las. Às vezes, é só isso que falta.

11 de dezembro de 2012

Sei lá, que roteiro a gente usa para dizer o quanto gosta de alguém?

Acordou e lembrou do dia logo que abriu a janela. Poderia acordá-la, quem sabe? Nunca foi de ligar à meia- noite porque acredita que as pessoas só conseguem pensar em dias seguintes depois que dormem. Então seria bom ligar de manhãzinha, ser o primeiro a dar bom dia e desejar tudo de bom. Acrescentar que sente muito ligar tão cedo, mas um dia tão legal como aquele merecia uma quebra de contrato. Um "seja feliz, tudo de bom" é legal não é? Seria especial para ela, não?

Não. Não poderia ligar e dizer qualquer coisa, tinha que disfarçar até o fato de não saber o que falar. Adianta perguntar só o que ela pretende fazer, quantos elogios já recebeu ou se poderia pegá-la no trabalho mais tarde? Quem sabe até daria pra levar um vinho e comprar aquele cupcake que os dois viram da última vez que foram ao shopping. Sei lá... que roteiro a gente usa para dizer o quanto gosta de alguém?

Wood Allen bem que poderia dar uma dica

Isso porque ela não é qualquer garota. Não que tenha se apaixonado por ela, mas não que não tenha se apaixonado também. A questão é que ela tem sido tão mais legal do que qualquer outra. Sei lá.. como a gente explica o quanto alguém é especial? Qualquer um que receba meia hora de atenção dessa mulher se pergunta como é ter ela de fato. Será que basta um pequeno agrado? Parece fácil pelo jeito que ela tem de olhar nos olhos e nos dar atenção, mas não é. É como se ela soubesse realmente para quem dar a confiança e o coração, como se fosse algum tipo de sobrevivente ou tivesse uma noção absurda da importância dos sentimentos.

Deu uma olhada no perfil de uma das inúmeras redes sociais existentes no mundo e percebeu que as tecnologias atuais roubaram todas as palavras bonitas de qualquer dicionário sabichão ou almanaque de textos que dizem o que a gente não consegue expressar. Hoje em dia todo mundo parece ser capaz de dizer coisas bonitas que não são normalmente ditas para qualquer pessoa, mas ao mesmo tempo todo mundo é capaz de se perder nas palavras e se tornar mais do mesmo também. Seria melhor pensar em algo que fosse parecido com os dois, que os ligasse, quem sabe? Isso sim seria especial e inovador, igual ao primeiro "seja feliz, tudo de bom" dito no mundo.

***

Saiu da agência com o relógio apontando 23h e sabendo que a bonita estava voltando de um barzinho com os amigos. Não deu para sair  mais cedo, o vinho ficou para trás e o cupcake foi esquecido. Não havia mais tempo para querer ser especial, mas ainda dava para Aparecer, apenas.

Entrou no elevador, apertou o 21º andar, bateu no 211 e foi falando antes mesmo da garota terminar de abrir a porta.

"- Passei o dia todo pensando em você, e sei lá, só quis passar aqui para te dar um abraço e dizer que eu quero que você seja feliz e todo aquele blábláblá que dizem nos aniversários.

- Nossa, obrigada por ter aparecido. Entra, a gente abre um vinho e conversa mais"

***
É assim que as coisas funcionam. Você não precisa seguir nenhum tipo de roteiro para dizer o quanto gosta de alguém. Claro que fazer coisas especiais que ainda não se tornaram mais do mesmo valem muito à pena,  muito mesmo. Mas a verdade é que às vezes a gente só precisa aparecer.

Apareça hoje, amanhã e sempre... principalmente quando não souber direito o que fazer ou dizer.


26 de novembro de 2012

As histórias por trás do seu travesseiro


Lembra daquela aula de expressões artísticas em que o seu professor te mostrou alguma obra na apostila e você ficou se perguntando como aquilo poderia ser considerado arte? Alguns podem mencionar "A Fonte" de Marcel Duchamp, que é aquele mictório invertido e assinado que vale três milhões de euros. Mas, eu lembro de "Ninguém" que é apenas um travesseiro bordado pelo artista brasileiro Leonílson. Além de eu nunca ter esquecido essa imagem, eu demorei alguns anos para entender o que o artista queria tanto expressar sobre nós e por quê eu deveria considerar que "Ninguém" é uma obra de arte.



E você sabe por que eu a considero uma obra de arte? Porque eu acho que ela tem muita coisa a dizer. "Ninguém" me faz pensar em quem se deita sozinho e tem um milhão de sonhos antes de dormir, me faz imaginar todas as pessoas que arrumam travesseiros para caber com alguém ali e das que afundam o rosto para achar algum resto de perfume. Eu lembro de quando a gente viaja e não o consegue deixar em casa, de todos que já brincaram de guerra de travesseiros na infância e de quem deita e apenas sente falta de alguém. 

Parece bobo imaginar isso, mas eu aposto que você já viveu qualquer uma das coisas que mencionei. Leonílson escolheu "escrever nos desenhos, ao invés de escrever nos cadernos" quando se apaixonou e quis expressar o que sentia apenas desse jeito. E assim o fez com uma série de outras obras desde que optou usar a escrita de uma forma diferente dos outros artistas, e esse era o seu diferencial.

Eu não sei quais são as vivências que Leonílson quis passar enquanto bordava "Ninguém", mas penso nas que eu fui colecionando ao longo dos anos. Tem o meu irmão, que sempre ocupa todo o travesseiro e me obriga a assistir TV deitada no colo dele. Tem o cheiro de creme de rosto que a minha mãe usava antes de me colocar para dormir e eu pegava no sono achando que tinha morangos por perto. E tem aquele namorado que insistia em arrumar o travesseiro para me deixar com mais espaço. E mesmo que não tenha dado certo, e mesmo até que eu tenha perdido um tanto de encanto, eu nunca esqueci que ele era um cara que arrumava travesseiros. 

E com essa minha coisa boba de imaginar diversas situações para um travesseiro virar obra de arte, eu bato o pé e aposto que você pelo menos concordou comigo quanto a todos os sonhos que a gente tem antes de dormir e o quanto isso é especial. E que agora você pode deixar de lado aquela coisa de "apenas um travesseiro assinado" e se basear na hipótese de que o artista entrou no quarto, sentou na cama e apenas quis falar tudo o que você também já sentiu.

Se ele queria expressar que "se sentia como ninguém", eu não sei. Se ele estava tentando ter os restos de alguma noite, eu nunca vou saber. Se ele apenas estava sentindo falta de alguém e só encontrava um vazio, não dá para provar. Mas que arte é a expressão de sentimentos humanos e que alguma história ele quis contar ali, eu tenho certeza. Travesseiros são cheios de restos de pessoas importantes, cheios de silêncios, imaginação e sons. Eles tem tudo para virar arte, principalmente porque são capazes de contar algumas coisas de nós.

18 de novembro de 2012

Entre vírgulas


eu, achei que, você era o amor mais bonito. E foi desse jeito mesmo, cheio de vírgulas e pontos e palavras inseridas na frente de qualquer coisa que pudesse evitar que eu dissesse que: eu, estava achando que, você assim, você aí na frente sim, era o amor mais bonito.

" - I love you.
- You don't have to say it just because I said it."

Lembra o show daquela banda que você gosta? Usei os benefícios da minha profissão para te fazer entrar no camarim. Isso porque, eu pensei, como você se sentiria. Claro que seria bem legal conhecer o cara que escreveu todas as canções que você fica cantarolando quando está distraída e não percebe que estou te observando vindo tomar achocolatado no meu sofá dentro daquele seu pijama largo, mas eu escolhi ver você voltando daquele corredor sem acreditar no que aconteceu.

"- É engraçado esse negócio que você tem de dizer as coisas em inglês no meio das frases.
- Às vezes eu fico enrolando para terminar uma palavra ou ideia também, já percebeu?
- Ah, mas isso é só quando você está falando sobre algo que sente, só"

Você já parou pra pensar no medo que todas as pessoas tem de sentimentos? Eu passei umas duas horas  naquele bar conversando sobre isso. E meu amigo aposta que me encantei por não poder te ler. Pelo fato de, você, não dar as respostas que eu estou acostumado a ouvir. Pelo fato, de eu, só conseguir falar sonoramente sobre sentimentos assim: entre tantas vírgulas.

Isso acontece por eu não querer que as palavras saiam de uma vez. É como se eu não quisesse dizer agora, bem agora, o que eu já disse tanto nas outras vezes. E disse tanto porque significava para mim, mas até hoje não sei se fez muito sentido para os outros. Sabe o que é pior do que não receber um eu te amo sincero? Não descobrir se alguém na sua vida já recebeu com sinceridade o seu.

"- Para, você reflete demais sobre as coisas. Isso faz mal.
- Isso é inevitável bonita, e vem desde a morte do Mufasa na minha infância"

 E aí que eu fiquei repassando na minha cabeça você voltando do camarim e me abraçando. Eu fiquei pensando em você, assim, toda assim de pijamas listrados e meias coloridas sendo o amor mais bonito que já esteve no meu sofá, na minha sala e na minha vida. Mesmo sem eu ou você mesma saber. Mesmo sem assim ser, ou ainda não ser.

Foi só um pensamento em você como tantos outros pensamentos existentes no mundo. Foi só alguns planos que fiz para conseguir dizer sem qualquer dificuldade de terminar as sílabas ou colocar  vírgulas, o que eu queria poder te dizer.

"- Eu disse porque eu acredito. Não pela pressa, não pelo tempo ou amarras ou todas as coisas que dizem. Eu disse porque eu sou de expressar as coisas. Mesmo entre vírgulas, sem terminar sílabas ou refletindo até quando isso vai valer a pena... então I, love, you."

9 de novembro de 2012

Você já foi um espermatozoide mais inteligente

"Se, a dois segundos antes de entrar no útero, fosse possível descobrir o quanto a vida é difícil, você hesitaria?"

Texto meu no Papo de Homem, pessoal. Leia o resto aqui.

"Missão ejaculada é missão cumprida, parceiro"

4 de novembro de 2012

A gente sempre deixa de cuidar do que já tem na mão


Nunca entendi a necessidade que os meus avós tinham em regar a horta duas vezes ao dia nos períodos de calor. Eles sempre separaram algum tempo da tarde para checar se a terra estava fofa, se nenhuma larva estava ameaçando o crescimento ou se as galinhas haviam pulado os portões durante a noite para comer o pé de couve.

Além do fato de que regar a horta duas vezes em dias mais quentes garante os alimentos que teremos algum tempo depois, os meus avós criavam algum tipo de afeto com todas as cebolinhas, cenouras, batatas,  cheiro verde ou qualquer outra planta que crescia naquele pedaço de terra. Parece bobo pensar assim, mas eu acredito que eles criaram algum tipo de amor e respeito pelo ciclo mais sincero da vida humana: você colhe o que planta. Tá certo que algumas cenouras e batatas nascem menores que as outras, mas isso não prejudica muito. Há sempre uma batata melhor crescendo embaixo da terra, só é preciso confiar no cuidado que você dá e merece de volta. 

Eu aprendi desde cedo que as relações humanas são como a horta do quintal dos meus avós. A gente tem que cuidar direito e criar um tipo de amor e respeito por tudo o que planta e colhe da vida. Tem que colocar a mão na terra sem medo de se sujar, checar como anda o crescimento, cuidar da invasão das larvas, galinhas ou ervas daninhas e não esquecer de regar. Regar sempre, do jeito certo e o necessário, principalmente porque tudo o que se planta sente sede, e você não pode esquecer disso. Às vezes, a gente rega pouco e não se preocupa quando o clima muda.

Nós temos essa coisa de entrar no piloto automático e esquecer de alimentar a horta que a gente vai construindo ao longo da vida. Mas, por mais que a terra adore o toque das nossas mãos, ela não vai nos dar o alimento que queremos se nós não dermos a atenção e o cuidado que ela precisa.  E se você não cuidar das pessoas que tem por perto, elas podem ir embora e não estarem aqui quando qualquer parte sua sentir sede ou fome. E elas estarão totalmente certas em não dar os frutos que você quer, mas sim, os que você merece.

Não sei se a  necessidade em regar a horta duas vezes ao dia nos períodos de calor sofreu um certo tipo de influência do que os noticiários diziam sobre o aquecimento global, mas sei que os meus avós levavam muito em conta o que sentiam quanto ao clima do dia, ou quanto ao que viam quando saíam pela janela de manhã. E essa preocupação em cuidar de toda a vida existente ao redor era uma coisa especial só deles, que eu tive o prazer de aprender a notar. E eu acho que o mundo seria um pouco melhor se as outras pessoas tivessem essa mesma característica. 

Eu não acredito nas voltas do mundo, ou naquela coisa de que todas as pessoas que te fizeram mal terão o mesmo mal de volta. Mas eu acredito nessa coisa de plantar, cuidar, colher, aceitar as cenouras menores que a terra te dá mesmo sem você merecer e confiar que as batatas melhores virão na próxima plantação.

Meus avós estão juntos há 56 anos e rodeados de pessoas que os admiram muito. Acho que eles sempre souberam cuidar - e continuar cuidando - de tudo o que plantaram durante o caminho, até mesmo com todas as mudanças e indecisões climáticas dos últimos anos. Talvez isso signifique muita coisa.

23 de outubro de 2012

Viajo porque preciso, volto porque te amo

Yellow Ledbetter by Pearl Jam on Grooveshark

Muitas pessoas tem motivos para viajar, não sou só eu. Toda semana é uma despedida, e dependendo do tempo que terei que ficar, todo mês talvez. Você sabe que estou chegando, mas também sabe que daqui a pouco eu vou embora. Às vezes é difícil, eu sei.

Viajo porque preciso. Ir embora neste momento é o que garante o futuro que quero ter. Não sei se vai valer a pena, mas fará diferença porque eu me acrescento quando viajo. Não vou mentir dizendo que não gosto de viajar, alguns caminhos me trazem uma alegria  que mostra que - de longe - esses são os melhores anos da minha vida. Mas também não vou negar que em algumas paradas ou curvas da estrada, no silêncio ou no barulho do caminho, eu paro e penso. "Eita vontade de voltar", "ai que necessidade de ficar", "tem como viajar na próxima hora?".

Volto porque te amo, porque entre tantos outros motivos para voltar há você me esperando. Eu sei que no nosso caso as coisas são um pouco complicadas e existe uma boa parte de ausência para as inseguranças que qualquer relação pode trazer, há a saudade que eu tenho que matar dentro de tantas outras pessoas, e uma falta que crio por ter que ir embora sempre, mesmo sem ir efetivamente. Mas, eu preciso que você se lembre disso quando eu não estiver aqui sem "não estar" efetivamente, porque de alguma forma eu sempre estarei. Volto por tantas outras pessoas que me amam, mas volto principalmente porque te amo também.

Não, não vai dar para viajar na próxima hora, mas pensa na história da mulher que já quis tanta coisa na vida e que agora apenas sonha com uma vida de lazer para si, para a filha e com algum companheiro que a ajude a esquecer que é "triste gostar sem ser gostada". Pensa no quanto ela, no alto de sua simplicidade, nos fez entender que "amor de lazer" é aquele que apesar de tudo o que tem que aguentar, oferece "amor e lazer" para quem dá isso para a gente. Eu gosto de você, você gosta de mim: nos gostamos de graça. Por que o ser humano quer e precisa mais do que isso mesmo?

Por todos os motivos do mundo: "Viajo porque preciso vírgula volto porque te amo ponto"
Não se esqueça.


14 de outubro de 2012

Foi notícia em toda a cidade: A.M realmente tinha aquilo.

A população observava de longe os movimentos daquela pessoa que tinha características humanas, mas vinha de alguma espécie diferente. Acordava, comia, dormia e usava o transporte público da cidade como todo mundo. Às vezes parava diante de alguma loja, esperava o próximo metrô e trocava o livro para utilizar os serviços do celular de última linha. Mas... tinha aquilo. 

Não diagnosticaram como doença e nem o tio mais velho soube explicar direito se aquilo era realmente uma benção. Quando indagado, apenas respondia. "Bem, talvez seja bom, talvez seja ruim, nunca se sabe. Mas ter isso no mundo de hoje é meio complicado, se é que você me entende. Não que eu tenha algum tipo de preconceito, mas é que as pessoas hoje em dia nunca aceitam o que é diferente". E A.M tinha dez anos quando escutou o próprio tio dizer isto.

E enquanto crescia, A.M recebeu conselhos dos pais, amigos e familiares sobre como lidar com aquilo que carregava consigo. A única pessoa relutante era o pai, que gritava para quem quisesse ouvir. "Você vai esquecer tudo o que te disseram, viu? Nada de se esconder A.M, você nasceu assim, vai crescer assim e não tem que esconder nada que venha de você! Se você é diferente, dane-se! Existe uma razão para isso e você não deve ter vergonha do que é, tá me entendendo?" Nunca confirmaram, mas parentes próximos afirmam que o pai de A.M também havia sido diagnosticado com... aquilo.

Não que A.M não goste de café, o problema é a gastrite. Não que A.M às vezes se distraia, o problema é o sono. Não que A.M não aproveite a comodidade tecnológica atual, o problema é a mania que possui em querer fazer parte das pessoas.

Foi então que o pai de A.M decidiu fazer uma viagem e conhecer o mundo. Médicos de outros países analisaram o caso e acrescentaram uma nota no histórico médico: "A.M tem aquilo, mas é como todo mundo. A diferença está descrita em anexo".

Após conhecer uma série de pessoas, histórias e outros mundos, A.M entendeu o que os médicos descreveram no documento em anexo e voltou para a sua cidade. A população observava de longe os movimentos daquela pessoa que tinha características humanas, mas vinha de alguma espécie diferente. A.M é como todo mundo. Acorda, come, dorme e usa o transporte público da cidade. É feita de carne, osso, razão e coração. Mas tem aquilo, e não consegue esconder. Às vezes não consegue nem evitar quando olha nos olhos de alguém.

A população da cidade ainda se mantêm atônita e surpresa por A.M ser como todo mundo, mas ter aquilo de ser sincera com as próprias emoções, de continuar acreditando em amor e sentimentos, de achar que a gente sempre pode chegar lá. Porque todos nós temos essa coisa de sentimentos e emoções, não é? Mas ainda sim, A.M era diferente.

"Deus ajude que ela nunca mude", disse o padre da cidade.



4 de outubro de 2012

Carta 22, somos tão jovens



"Você deveria ter virado hippie. Deveria ter lutado por paz e amor em uma época de repressões e pintado o rosto de verde e amarelo em plena praça pública. Não é tão perigoso assim omitir algumas  poucas coisas dos seus pais,  nenhum trem vai pegar fogo ou atravessar o seu caminho por causa disso.

 Você deveria ter namorado aquele cara que te roubou um beijo e ter dançado as músicas do Michael Jackson no baile. Aliás, você realmente precisava ter deixado de lado as fofocas das vizinhas e ter cabulado mais aulas na praça. Sem querer parecer arrogante, mas a gente tem que aprender o mais cedo possível que o que os outros pensam ou falam não significa nada na nossa vida, e acho que você ainda não descobriu isso.

Eu adoro o seu sorriso naquela foto 10 cm x 15 cm que roubei pra mim. Aliás, te ver segurando aquela flor me dá uma esperança em algo que eu não sei o que é. E as suas mãos? Eu tenho uma saudade enorme daquelas suas unhas vermelhas, nossa... como eu tenho. Mas, agora... me conta bonita, onde foi parar a sua menina? Coloca uma flor rosa no cabelo e puxa ela de volta. Diz  que eu tô com saudade e que quero vê-la bem novamente. Volta meu bem, vem viver  e descobrir que todo dia é novo cheios de outros lados da vida. Vamos cantar no meio da rua? Vamos rir com gosto ao ponto de  fazer todo mundo notar os sons do nosso sorriso, ou rir junto até... vamos? Reage, faz qualquer coisa, mas volta  e vem ser a minha amiga. Eu sei que é difícil, que há muitas coisas que eu não tenho ideia de como você pode aguentar. Mas, e se for possível deixar a mágoa no passado ao invés de tão no presente?


*****

Vire hippie hoje. Compre aqueles óculos azuis e comece a lutar por paz e amor em uma época cheia de repressões silenciosas. Faça o  shuffle escolher "Pra não dizer que não falei das flores" e acredite que o mundo ainda tem chance. Reconheça que a "geração internet" já está fazendo a própria revolução e dê um descanso para as suas preocupações. Minta para um desconhecido e  ria da história maluca que você está inventando. Faça algo em segredo! Namore aquele cara que te roubou um beijo no meio da dança, porque depois de tanto tempo, ele ainda te ama. Ainda dá tempo de aprender os passos do Michael Jackson e dançar de qualquer jeito e em qualquer lugar. Ainda dá tempo de mudar e ser o que você quiser.



Não aceite simplesmente e nem compreenda facilmente. Questione, tente realmente entender. Evite respeitar espaços quando algo te sufoca e nunca, mas nunca mais, fique em silêncio outra vez! Pise na grama descalça, adote um cachorro e deixe ele morder a sua meia. Abra as portas e permita que ele corra pela casa inteira ou encontre um jeito de deitar entre as suas pernas.

Ontem eu encontrei a sua menina quando cheguei da festa da faculdade, ela estava dentro dos seus olhos. Ela pediu para voltar assim: aos gritos, aos montes e fechando a porta. Eu fiquei olhando ela ir embora frágil e pensando em todas as coisas que poderiam ter feito ela ser mais feliz. Que ainda podem e que ela não faz por um zilhão de motivos que tem a ver com os outros e nunca consigo mesma. É que a menininha se perdeu, bonita. E você precisa trazê-la de volta. Chegou a hora de pensar em vocês duas daqui para frente. Ela fechou a porta dizendo aos gritos e aos montes que sente saudades de viver a vida, que sente saudades minhas, que sente saudades suas, que sente saudades nossas. Vai lá fazer ela feliz.

O que te faria perceber que, apesar de tudo, você ainda tem todo o tempo do mundo para sugar todo o tipo de prazer, sentimento e vida existente na face da terra?"
e eu te amo

27 de setembro de 2012

É assim que eu gostaria de poder te olhar



Quando a hora certa chegar, é exatamente desse jeito que eu gostaria de poder te olhar. Eu vou querer te ver depois de um dia cansativo de trabalho, porque ver quem faz bem acalma e melhora. Estou naquela fase dos vinte e poucos anos em que você tem a sensação de que as coisas estão um pouco fora dos eixos e que ser adulto não tem tanta graça assim.

Eu acho que te amo porque tenho vontade de cuidar de você e saber como as coisas estão. Eu acho que te gosto, porque só de te ver chegando no fim da rua já provoca qualquer coisa em mim que não sei dizer ao certo. Sempre tive essa correria e todo esse nosso negócio de querer ser feliz lá na frente, e já perdi a conta do número de vezes em que fiquei pensando em tudo o que tinha para fazer no dia seguinte e não no que ainda estava acontecendo. Eu sei que sempre me preocupei demais com a felicidade que quero ter amanhã, mas quando você viajou para o outro lado do mundo e ligou a webcam só para me fazer rir, eu percebi o quanto já estou sendo feliz agora. De repente eu descobri que estou sendo muito mais feliz hoje do que achei que poderia ser em qualquer dia seguinte.

Apesar de prepararmos surpresas um para o outro de vez em quando, os momentos mais bonitos e intensos acontecem quando não esperamos.  Antes eu achava que uma prova de amor tinha a ver com grandes gestos e exposição, agora não. As expressões mais bonitas e significativas que existem são simples. Flores são doces, mas murcham três dias depois. As nossas lembranças e coisas que só a gente tem sobreviverão há um bom número de estações.

A gente só percebe que existe sentimento com o tempo, ou com algum tipo de contratempo que nos tire da zona de conforto habitual. Quando a vida realmente decidir nos dar um daqueles momentos que nos tiram dos eixos, é exatamente desse jeito que eu gostaria de poder te olhar.

Ordinary Girl by Waz on Grooveshark



21 de setembro de 2012

Ana

Eu poderia dividir a minha vida em duas etapas: antes e depois de Ana. Embora Ana nunca tenha sido um grande amor na minha vida, ela ainda era o exemplo que eu usava para falar de sentimento. Eu não lembro dos meus caminhos antes de Ana, nada se compara ao dia em que vi a menina dos cabelos encaracolados andando de bicicleta na minha rua. Era Ana, menina-bonita-moleca-sorridente. Era Ana entrando na minha vida, simplesmente.

Lembro de quando a encontrei saindo do trabalho e conversamos sobre as primeiras emoções da nossa adolescência. Não contei a menina-bonita-moleca-sorridente que a primeira emoção que senti foi por ela.  Aliás, eu nunca contei nada a Ana. Nunca deixei explícito que ela era a minha menina, até mesmo quando a escutava contando histórias sobre o garoto dos olhos bonitos que olhou para ela. Eu não era o menino dos olhos bonitos de Ana, aliás eu nunca fui, mas ainda sim era quem seria capaz de passar uma vida inteira olhando para ela.

Até o dia em que viajei e conheci as montanhas. Coloquei a mochila nas costas e me dei ao luxo de trilhar um caminho sem rumo e sem planos depois de ter escutado de Ana que não estávamos preparados, que precisávamos conhecer a vida. Logo a menina sorridente que me transformou naquele primeiro beijo, logo a bonita que eu encostei na parede e disse tudo o que sentia, logo a boneca que se desencantou depois de um certo tempo. Aproveitei que Ana foi estudar no exterior e coloquei o pé na estrada. Fiz amizade com um louco sem dinheiro algum no bolso que queria conhecer o mundo, mas não pode chegar ao topo dele. Ele estava cansado de andar por aí com aquele vermelho extravagante fingindo ser quem ele não era. Continuei o meu percurso em direção ao meu lugar preferido na terra. Eu queria ter o mundo inteiro nas mãos para fugir do fato de Ana ter dito que eu não estava pronto. E, só até certo ponto, eu não estava mesmo. 


Se eu pudesse inventar algum tipo de verdade, eu diria que um homem só se torna homem depois que escala uma montanha. A gente aprende que é preciso continuar escalando mesmo após algumas quedas, mesmo com as dores nas pernas e uma outra série de coisas. Quando você chega ao ponto mais alto, você se torna pronto para qualquer outra montanha na vida, não importa o tamanho que ela tenha. Superando toda a dificuldade da escalada, a gente encontra uma vista linda, algo que te faz acreditar que qualquer coisa é possível nessa estrada e qualquer erro que você venha a cometer é pequeno perto da imensidão que existe para te dar a oportunidade de consertar. Naquele dia eu estava pronto para tudo. Para o bom, para ruim, para a vida e para Ana. Acho que todos nós deveríamos encontrar o nosso lugar preferido na terra, não importa onde nos encontremos.

Voltei. A transformação pessoal que tive durante todo o ano em que viajei não se compara ao minuto em que me tornei outro por não ter encontrado Ana. Ouvi dizer que ela já não era sorridente e tentei descobrir se tinha algo a ver com os problemas familiares que ela costumava disfarçar tão bem ou com o os arranhões que havia sofrido no coração. Lembro que ela carregava o mesmo sorriso quando parti. E ainda me fez prometer que eu voltaria, que não me deixaria levar pela curiosidade de outras terras, outros gostos e outros mundos. Sei que quando algumas coisas não dão certo, surgem aqueles restos de mal entendidos e se eu fui algum tipo de arranhão para Ana, tenho certeza que fui o único machucado doce daquela menina. Doce, porque é aquele que não traumatiza, que não mancha o carinho  ou o afeto, e que acontece às vezes entre duas pessoas que não sabem lidar muito bem com essa coisa de sentimentos. A gente precisa amadurecer um para o outro às vezes. É por isso que duas pessoas conseguem passar anos uma ao lado da outra e só vão se apaixonar lá na frente. É por isso que a gente toma pancada e entorta, leva "chapuletada" e endurece, se apaixona e amolece. Essa coisa de a tampa certa da panela é balela, coisa do tempo dos avós. Hoje em dia, a gente passa por uma série de experiências para aquetar alguma agonia no peito e depois vai se entortando para encaixar em outra tampa. Arrumar nossas elevações para cabermos em alguém, isso é amor pra mim também.


Acontece que a menina-bonita-moleca-sorridente virou mulher e a vida lhe pareceu algo injusto, algo pesado demais para alguém como Ana. Na minha opinião, a menina dos cabelos encaracolados que andava de bicicleta na minha rua tinha muitos medos e ninguém para se agarrar. Se eu pudesse, teria levado Ana até as montanhas. Teria ensinado a menina que mudou a minha vida, mas não pôde ser o meu grande amor, que as coisas podem ser ser pesadas assim mesmo. Mas, que a vista no final seria linda se ela encontrasse uma boa companhia para continuar andando. Alguém que fosse capaz de se encaixar às partes entortadas que a vida te deu e às endurecidas que ela te impôs. Eu poderia ser o par de Ana, eu poderia lhe dar a mão, lhe cantar aquela canção. Eu poderia tanta coisa se você tivesse deixado Ana, aliás eu poderia tanta coisa se você tivesse ficado.

É uma pena você não ver o mundo daqui de cima menina, mas acredito que você tentou chegar aonde pôde. Quando digo que você não é o meu grande amor é porque ainda não vivi todos os amores necessários para saber qual é o maior, embora tenha alguma ideia. Ninguém conseguiu chegar dentro de mim como a menina  dos cabelos encaracolados que se interessou pelo meu machucado no joelho e decidiu fazer medicina. Só Ana, mulher-linda-frágil-não-tão-mais-sorridente que se afastou e me tirou a oportunidade de estar aqui quando ela precisasse. Se você tivesse sobrevivido, eu poderia ter te trazido comigo. As coisas poderiam ser diferentes e você poderia apenas aprender que levantar no dia seguinte, mesmo sem muita vontade, é seguir em frente. Você deveria ter me aceitado quando ainda era menino Ana, simplesmente. Eu teria ficado,  sim, até se você exigisse que fosse eternamente.

"Se ela tivesse sobrevivido, poderia ter vindo para cá comigo, 
talvez eu pudesse ter dito algo a ela, ter feito com que ela se sentisse de outro jeito
Talvez eu só fizesse amor com ela e não dissesse nada."
Kerouac em  Os vagabundos Iluminados


20 de setembro de 2012

Balões de água discretos que não sabem esvaziar

Sou o tipo de pessoa que não solta o choro às vezes, é como se eu sentasse na cadeira e sentisse um balão dentro do peito se enchendo. E eu sei que é o choro que quer sair, mas não sabe como, porque quando ele tentou ir embora eu estava no meio daquelas pessoas e o prendi. Quando ele quis cuidar de mim, eu disfarcei e o deixei acumular.

A primeira coisa que faço para manter o choro preso é me distrair. Foco no projeto que preciso entregar no dia seguinte, dou um pulo rápido no banheiro para evitar as gotas pulando para fora e disfarço indo pegar algum copo de água. Se eu conseguisse pelo menos chegar em casa antes do balão estourar já seria ótimo, mas às vezes não dá. Esses dias eu fiquei pensando se as pessoas que choram no metrô se sentem mais confortáveis no meio de desconhecidos, do que no escritório com os colegas de trabalho durante mais um dia aparentemente normal. Aparentemente normal.

O ruim de tentar se distrair é que quando você realmente pode esvaziar, o negócio que estava pesando no peito não vai embora. É como se os nossos balões precisassem de plateia e a gente não soubesse, e é como se o corpo ainda estivesse acostumado a ganhar o mesmo tipo de colo e carinho que recebia quando chorávamos na infância. Há algo incômodo por dentro e nada explica ele não querer esvaziar quando a gente quer ou pode.



O problema de balões que enchem e não sabem esvaziar é que eles estouram de repente. Você sabe disso quando vê lágrimas caindo no meio do nada ou no meio de todo mundo. Às vezes a gente não precisa nem chorar quando elas vazam sem inundar nenhum tipo de poro ou passar por alguma camada de pele. As gotas apenas começam a cair uma por uma bem em cima do estômago, de um jeito que qualquer alimento ingerido provocaria um acidente, de um jeito que a gente só consegue se controlar ficando quieto e sério. Balões cheios por dentro não podem encontrar espaços para fora. Se abrirmos a boca, o ar já ameaça faltar. Se alguém chegar mais perto, o corpo já pede colo.

Quando você sente um balão enchendo e não quer soltar é uma agonia enorme. Uma agonia que você despreza com todas as forças para ela ir embora e voltar mais tarde. Balões cheios são perigosos, pesam no peito, no corpo e de um jeito que às vezes mal dá para andar. Hoje há um balão sozinho dentro de casa que não sabe esvaziar. É como se ele quisesse algum tipo de plateia e sozinho no espetáculo, desistisse de se apresentar. É como se o corpo sentisse falta de algum tipo de balanço parecido com o que recebia na infância quando começava a chorar. Ou talvez ele só esteja me castigando por eu não ter deixado ele ser frágil, por eu ter me feito de forte e não ter deixado ele se soltar. Por eu ter esquecido que ele era humano no meio de todos aqueles humanos que também carregam balões de água e os forçam a ser discretos, como se existisse uma hora certa para esvaziar.

15 de setembro de 2012

A gente bebe e fica afim de dizer eu te amo

E eu me pergunto por que aquelas primeiras duas horas na mesa nos deixam tão vulneráveis a pegar o celular e ligar para algum ex? Por que eu não aproveito as segundas insuportáveis do metrô lotado para xingar, ou até mesmo dizer "Amor, volta. Essa vida maluca de trabalho pesado é horrível sem você". Por que não faço isso quando estou lúcida?

Meu amigo chega e bate na porta. "Luana, me dá esse telefone. Não liga para ele, hein?". Tarde demais, já disquei o número. A coisa mais difícil do mundo é ter um amigo paquerador que cuide bem do seu celular. Aproveitei a primeira loira que passou, peguei o aparelho na mesa e saí andando e trombando em todo mundo para ligar para o meu último cara, o meu último alguém... peraí, ele não é mais meu.

E enquanto ele demora para atender, eu só fico pensando no que vou dizer. Me seguro para não chorar e me arrependo de ter exagerado na vodka. Espera, eu nem sei o que estou pensando direito. Por que ele não me atende? Quem demora para atender um celular às 3h45 da manhã? "Luana, para com isso, volta para a pista. A balada está cheia de cara para você". Eu sei amigo, mas ele sabia como conversar comigo. Ele chegava debochando de alguma coisa e falavamos por horas sobre vários assuntos, e nunca cansava, nunca. Ao contrário desses caras querendo cochichar no meu ouvido por causa desse som alto. E não, não vou para nenhum lugar mais calmo. Ok, eu sei que ele é um idiota. Tá, eu sei que mereço alguém melhor. Para de falar que ele atendeu.

"- Alô, tá me ouvindo direito? Tudo bem?
- Tudo sim e aí?"

E aí que eu disse eu te amo enquanto ele disse que eu ia ficar bem. Eu disse eu te amo enquanto ele quis saber onde eu estava, com quem eu estava e se eu tinha alguém para me levar para casa. Eu disse que o amava enquanto ele dizia que essas coisas iriam passar, que era muito recente, que já tentamos bastante e tentar de novo só iria nos machucar. Mas ele disse que eu significava muito para ele, que eu fui importante. Fui importante?

Ele sempre foi o mais racional. Ele sempre foi a cabeça pensante e eu a sonhante. Costumávamos dizer que a gente se completava, mas é preciso ser muito mais do que uma metade para fazer um relacionamento dar certo. Somos todos inteiros e não existe ninguém pela metade. A gente tem que tirar esse negócio da cabeça de que vai encontrar alguém totalmente perfeito ou que seremos a perfeição de alguém. Ou que quando acaba um relacionamento, não encontraremos mais ninguém. Além disso, ele usou "fui", no pretérito perfeito mesmo. Não existe amor no pretérito perfeito. Só quem quer seguir em frente é que usa o pretérito perfeito.  E aí que discutimos novamente e eu desliguei depois de dizer "Ninguém nunca vai te amar e ser tão legal com você como eu fui, 'tá me entendendo?".

Não sei se a minha ligação fez efeito, não sei nem se vai mudar alguma coisa eu ter conseguido desabafar o que sentia. Mas, eu explico ao meu amigo que aqueles três copos de bebida são os culpados pelo lapso de loucura que tive e peço desculpas por ter sido grossa com ele. Sim, você está certo, ele me machucou e nunca me mereceu. Sim, ele era um idiota e eu não sei porque ainda me sinto mal. É verdade, é melhor eu desligar esse celular.

E enquanto eu desligo o celular, eu fico pensando que meu amigo estava certo desde o começo. E se eu não tivesse ligado, eu não estaria nem um pouco com a sensação que estou agora. O meu ex poderia até estar pensando que estou bem, que me recuperei e estou me divertindo, ao invés de saber pela minha boca que ainda gosto dele. E não faço essas ligações no metrô lotado, porque nele sei o quanto não deu certo e o quanto foi difícil terminar. Nele eu sou menos impulsiva e mais racional até. A gente bebe e fica com vontade de dizer eu te amo, mas não é só isso. A questão é que a gente se toca que o ex é um idiota, mas é um idiota por quem a gente sente alguma coisa. É um imbecil, mas é um imbecil com quem a gente se importa. Existem muitas outras pessoas legais por aí sim, mas nenhuma delas me faz ter essa saudade ou me faz sentir o que aquele idiota me fazia. E agora?

E agora é que meu amigo vai ter que esquecer essa morena. Amigo, pega meu celular de novo e vê se cuida dele direito. Esconde isso e não me devolve nem que eu implore! Me leva para dançar, me faz esquecer disso. Não não, senta aqui e me dá colo. Eu bebi, e tô com vontade de dizer eu te amo. Não deixa.


6 de setembro de 2012

Cicatrizes


Você pegou a minha mão e perguntou de uma cicatriz que tenho e que já está há tanto tempo comigo que eu quase nem noto que ela existe. Sei que foi na infância e que teve alguma coisa a ver com o ferro de passar, mas não sei o que aconteceu e nem lembro da recuperação. Após isso, conversamos sobre outras duas cicatrizes que também perderam a história que tinham para contar, mas que estiveram na pele durante todo o tempo.

Foi aí que eu percebi que adquiri machucados que cicatrizaram e ficaram no meu passado de um modo que eu não os percebo frequentemente. Observando bem atentamente as minhas mãos, eu encontrei a cicatriz do plástico derretido que caiu no dedo, a mordida do cachorro na casa da amiga, o grafite da lapiseira do melhor amigo que nunca saiu e a marca de ferro que até hoje me ajuda a descobrir qual das minhas duas mãos é a esquerda. Sem contar todas as treze vezes que fiquei com algum tipo de gesso. Sim, treze.

Quando eu conseguia enganar a minha mãe, eu era o tipo de menina moleca que brincava de pega pega descalça na rua da avó, que subia no pé de goiaba para comer fruta, gostava de procurar tatu-bola na terra, mas não conseguia manter a pipa lá em cima. Na adolescência, eu era o tipo de garota moleca que jogava basquete com os meninos, não sabia muito sobre essa coisa de maquiagem ou  beijo na boca, mas aprendeu a andar de skate só porque se apaixonou por alguém.

Durante todos esses anos eu adquiri machucados que cicatrizaram e acredito que só ficaram no meu passado, porque eu parei de olhar para eles e lembrar de como me machuquei. Observando bem atentamente as minhas mãos, eu descobri que caí o suficiente para encontrar diversas marcas nelas, mesmo que uma boa parte delas tenha fugido da memória. Apesar de ainda existirem na pele, elas foram embora de um jeito que eu quase não lembro da dor. Sei que ela existiu, tenho uma ideia de como foi, mas isso não me afeta mais.

Quando eu consigo enganar meu medo, eu sou o tipo de garota-menina-moleca-mulher que brinca de pega pega na vida e se esconde do asfalto para pisar descalça na grama. Claro que não tenho mais a facilidade de subir em árvores, mas nunca me importei com a dificuldade que seria necessária para "comer a fruta do pé". Já sei lidar com essa coisa de maquiagem, mas às vezes sinto aquele frio na barriga do beijo. E continuo aprendendo muitas coisas ao me apaixonar por alguém.

Você prestou atenção nas minhas mãos e fez eu descobrir que todas as nossas dores vão embora algum dia. A gente até ri de algumas delas mais tarde, mesmo sabendo que quando elas apareceram nós choramos, fizemos cena e pedimos colo para a mãe. Claro que eu passei a tomar mais cuidado com os ferros de passar e com os animais de estimação dos meus amigos. Mas, em momento algum eu deixei de brincar com algum deles ou de passar a minha roupa. A questão é que eu descobri que é preciso aprender a cativar qualquer animal de estimação antes de me aproximar. É necessário chegar com jeito, devagar e com carinho nos cães, porque eles podem se assustar e te morder para se proteger, mesmo que você só queira lhe fazer um afago.

Um dia, qualquer dia, alguém vai pegar nas suas mãos e perguntar sobre as suas cicatrizes. E então você vai refletir se vale a pena se proteger tanto da vida depois de tantas marcas que passaram. A gente se machuca para aprender a deixar de se machucar, só isso.
Pode ser que você tenha apenas uma vaga lembrança sobre a história das suas marcas, talvez você até fale sobre o assunto sem sentir dor alguma, e quem sabe as suas cicatrizes até te ajudem a levantar no dia seguinte. A gente também se machuca para aprender a descobrir um jeito diferente de seguir em frente.
E se ainda existir dor em alguma das suas feridas, você receberá o afago de quem se interessou em ouvir  e saber sobre elas, porque cicatrizes também existem para nos ensinar a cuidar de um machucado que nem é da gente.

1 de setembro de 2012

Carta 21: blusa amarela, saia, tênis e abraço

Antes de começar a escrever eu pensei no quanto eu teria que agradecer a Deus por você estar comigo. Fiquei imaginando o quanto ele foi costurando todos os acontecimentos da minha vida e te colocando por perto para me deixar bem, para me falar Dele e me acalmar com aquele seu abraço leve que traz calma.

 E começando a escrever, eu percebi o quanto eu devo te agradecer por ter estado por perto e por ter estado comigo. Eu tenho uma admiração, um afeto e um carinho enorme por você. Sei um pouco da sua história e descobri a sua mania de falar em silêncio. Até mesmo quando nós nos abríamos uma para a outra.
Lembra no começo da faculdade que você se sentia sozinha e eu disse que se você fosse para a esquerda eu iria também? Pois é, vai ser sempre assim.

E eu quero que eu estarei aqui até mesmo se você quiser conversar em silêncio ou só precisar de um abraço. Me lembro daquele dia em que cheguei na faculdade com a maior dor de cabeça do mundo e você saiu da sala de informática dizendo que só queria me dar um abraço. Te vi voltar para o computador com aquela sua blusa amarela, saia preta, meia de bolinhas e all star. Nunca vou esquecer o quanto o seu gesto significou para a dorzinha que eu tinha no peito.

Não importa o quanto eu escreva, não sei se conseguirei expressar tudo o que quero ao certo. Muito menos o quanto eu o quanto eu te admiro e nem o quanto eu quero te ver feliz. Nós temos os nossos medos, nossas dúvidas e sempre terminamos nossos almoços com confissões e reflexões. Mas eu sinto que de alguma forma, vamos passar por essa vida de um jeito extraordinário. Você é uma pessoa incrível, e eu tenho certeza que Deus te olha com ternura todos os dias. Meu coração teve seu carinho sempre que precisou, e eu nunca vou esquecer disso.

De uns tempos para cá eu parei de dizer eu te amo toda hora e para qualquer um. Banalizaram o significado disso e eu percebi que é muito fácil dizer quando não se sente. Mas, a questão é que até agora eu escrevi todas as palavras do mundo e não consegui me expressar totalmente. Então.. eu te amo muito, e falo isso que é para transparecer que você é uma das pessoas do meu mundo tão cheio de segredos, intimidades e verdades. Um mundo que é só meu, que pouca gente sabe ou entra. E você entende o que eu quero dizer.

Obrigada por tudo e conte sempre comigo, porque se você for para a esquerda, eu irei também.

postagem editada de carta escrita em 2011

26 de agosto de 2012

"Why didn't you try harder? You just left"

Não adianta, toda vez que me falarem sobre coisas eternas eu vou lembrar daquele último texto que escrevi para você. Vou automaticamente pedir licença para qualquer atividade que eu estiver fazendo e procurar o texto de despedida, reler todo aquele sentimento que eu coloquei no papel para dizer adeus e passar os meus olhos pelas palavras que escrevi para ir embora sem nunca ter ido. Não sei se vou, eu volto às vezes. Eu fui? 

Depois de tanto tempo, às vezes eu afirmo que é fácil seguir em frente. Vinte e poucos anos, pés na carreira, dinheiro no fim do mês para bancar contas e divertimentos extras nos finais de semana. Sem contar os novos amigos que a gente conhece sempre e as trocas de olhares que garotas de vinte e poucos anos dão, enquanto desfilam as suas saias e olhares pela Avenida Paulista. Nessa vida e nesse enredo é muito fácil continuar seguindo e lembrando de você entre uma estação e outra do metrô, ou até o farol abrir novamente.

Difícil mesmo é quando você me aparece na frase de um livro que leio de madrugada ou no texto de algum blogueiro que eu recebo no meio do trabalho. Essas horas são um pouco piores, porque nelas eu estou sozinha com o meu pensamento e sem nada para me ajudar a fugir deles. Eu lembro que você se tornou um homem, mas não vai viver a sua maturidade comigo. Imagino o quanto você pode estar feliz com essa nova vida, mas não vai me contar sobre ela antes de dormir. Penso que faz tanto tempo que não te vejo que quase não lembro da sua risada escandalosa no portão da minha casa.


E durante três segundos eu lembro que te amei. Eu penso que enquanto eu estou desfilando as minhas saias e preocupações por aí, você está começando uma família por causa dos acidentes que às vezes acontecem na flor dos vinte e poucos anos. Eu penso que você virou um homem, que a sua perspectiva de futuro está completamente diferente da minha, mas que talvez você esteja feliz com isso. Ansioso até. E maduro com aquele seu jeito de menino que ri escandalosamente no meio da rua.

Você riu e foi embora como tantas outras vezes. E eu só viro de lado e procuro algo para fazer, porque é mais fácil te esquecer enquanto estou em movimento. Mas, se tudo estiver realmente silencioso, eu releio o texto de despedida para lembrar de todo aquele sentimento que eu escrevi para dizer adeus. Eu passo os meus olhos pelas palavras que me fazem enxergar que eu precisava ir embora, mesmo querendo voltar. Eu tive que ir, mesmo olhando para trás. Eu voltei, mas já era para eu ter ido.

Calma, espera um minuto. As lembranças são a única coisa que eu tenho, já já eu vou ...

21 de agosto de 2012

Para onde estamos indo?

Queriam que eu fosse mais caseira, casasse com o primeiro namorado e trabalhasse perto de casa. Não, não é preciso ir atrás disso tudo, e para que significado? Felicidade é conseguir comprar o que se quer. Esses sonhos são anseios da juventude, algo que vai passar. Você cairá na real quando for adulto e viverá de acordo com o sistema.

Mas aí, eu quebrei todas as regras, comecei a escrever, me apaixonei muito mais que duas vezes e fiz planos de colocar uma mochila nas costas e conhecer a estrada depois de Kerouac. Escolhi andar para fora do caminho, as montanhas tiveram outro significado e conhecer novas histórias passou a ser um objetivo. Um hobby. Um aprendizado. Ou qualquer outro nome que você queira dar.

Um dia, eu descobri que o mundo deles não é como o meu. Não sei como vou chegar lá, mas sei que não quero cair no sistema e acreditar que felicidade profissional é conseguir comprar o que se quer. Falam que é anseio da juventude e que isso vai passar, então que eu tenha essa coisa de jovem sempre. 

14 de agosto de 2012

Tome um pé na bunda, e diga obrigado!

O seu maior pé na bunda te salva de todas as maneiras amorosas que você poderia ser salvo. Acredite, o maior "quebrei a cara" da sua vida te trará benefícios se você souber se curar dele, claro. Aceitar que um relacionamento não deu certo às vezes demora e partir para outra "novo em folha" é difícil. Ao mesmo tempo que não reconhecer os próprios erros é burrice, e passar a acreditar que o amor não existe é dar um passo para o fim da linha.

O pé na bunda te coloca nos eixos para você saber viver na realidade. Se o primeiro amor nos traz toda aquela descoberta de sentimentos intensos, paixão, afeto e até mesmo o sexo, o seu primeiro pé na bunda te mostra que um bom relacionamento precisa também de inteligência e razão. Você tem que aprender a fazer a sua parte e saber o que esperar do outro.
Aprendemos que antes de amar alguém temos que amar a nós mesmos. A gente cresce e percebe que merece ser feliz todos os dias dormindo sabendo quem a gente é, e acordando ao lado de quem merece nos ter. Antes de alguém para nos amar, que exista alguém capaz de deixar passar os nossos defeitos ou manias. Já dizia Clarice Lispector "Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro". Pois é, quem vai aceitar o defeito que te deixa em pé?


6 de agosto de 2012

Carta 20

"Dizem que a incapacidade de aceitar a perda é uma forma de insanidade. Deve ser verdade. Mas, às vezes, é a única forma de nos mantermos vivos"
Talvez em algum lugar do meu inconsciente existem mais pedaços de momentos nossos. Você me curtiu muito, tenho certeza. Sinto isso quando lembro das nossas danças na cozinha e de você provando que confiava em mim deixando eu fazer a sua barba. Hoje eu senti saudade e não consegui escrever uma linha. Imaginei que se sentássemos na mesa da cozinha e eu te contasse quanto coisa me aconteceu esse ano, você escutaria quieto tomando o seu refrigerante. 

Talvez  você sorrisse ao saber sobre a carta que escrevi para o Igor e ficasse assustado por eu ter pedido demissão com três dias de trabalho e trocado de estágio três vezes em apenas um ano. Talvez você tiraria um sarro da minha cara quando eu descrevesse o quanto fiquei sem jeito ao encontrar o menino dos olhos bonitos e o quanto eu aprendi  sobre oportunidades perdidas com ele. Talvez você me desse uma bronca por ter mentido sobre a minha primeira balada ou por ter beijado aquele cara sem saber se ele era realmente legal.  Há muitos talvez para nós.



25 de julho de 2012

Era para eu ser só mais uma garota no bar

A gente não liga muito para os dias comuns, geralmente acordamos mais focados nas coisas do trabalho, da faculdade ou pensando sobre algum relacionamento que tivemos. Na maioria dos calendários, os dias marcantes estão sublinhados e são contados nos dedos para que cheguem logo. Mas, foi exatamente em um dia comum que eu te encontrei.

Se as pessoas estranham quando alguém vai ao cinema sozinho, fico pensando o que elas estavam imaginando ao me ver sentada naquele bar apenas com um copo de cerveja como companhia. Eu não me importava muito e nem tinha paciência para observar casais ou pessoas acompanhadas naquele instante, logo eu que gosto tanto de observar coisas simples, mãos dadas, abraços e carinhos. Mas naquele momento, eu queria ser só mais uma garota no bar pensando sobre a minha própria vida. Nem me preocupava se iria passar desapercebida por ali ou não, até que você chegou e puxou algum assunto que eu nem lembro direito qual era.

Só sei que nós éramos duas pessoas de saco cheio. Acontece. A gente acorda e percebe que estamos com todos os pensamentos de dias comuns acumulados. Eu não sei o que fez você sair da sua rodinha de amigos e se interessar em compartilhar os seus problemas e escutar os meus, mas depois disso as coisas mudaram para mim e para nós. Nenhum de nós dois nos sentiríamos mais sozinhos.

6 de julho de 2012

Liberdade, séc. XXI e solidão

Dias desses tive uma conversa de bar com um velho amigo, que entre um copo de bebida e outro, disse estar se sentindo velho demais para a vida de solteiro. Concluímos que apesar de todos nós sermos livres o bastante para sairmos em um sábado e curtir uma noite de beijos e abraços com qualquer um, de vez em quando temos dificuldade em lidar com o fato de passar os outros dias da semana sozinhos. A verdade é que a gente é a favor da liberdade, mas não consegue lidar com a solidão.
 

Mas, será que a gente sabe o que é ser sozinho? Mário Quintana escreveu uma vez que 
"Só Deus - que é único, que não tem par - pode dizer o que é a solidão". Será?

27 de junho de 2012

Carta 19, entre bolhas e garrafas eu entendi o autismo


Eu não sei exatamente em que parte da minha vida eu percebi que cuidaria de você, mas lembro que sempre pedia um brinquedo para nós dois nas cartas que escrevia para o Papai Noel. Eu sei que quando a mamãe nos deixava dormindo no quarto, eu te transformava na minha conchinha. Eu tinha medo do bicho-papão sair de debaixo da cama e você era a minha proteção. Eu ficava pensando que poderia gritar: “Ei, cara, ele é o meu irmão! Olha o tamanho dele!”.
Eu também não lembro como ficamos quando o papai foi embora. Nunca vou saber o que você lembra ou entende sobre o homem mais importante das nossas vidas. Mas eu sei que você sabe o que é saudade, porque quando a mamãe demora para chegar, você abre a janela da sala e fica esperando-a aparecer. No começo eu achava que era o tédio de ficar brincando de bonecas ou vendo eu dublar aquela minha banda favorita, mas depois eu entendi que era amor. Aliás, tudo que eu sei sobre amor foi ensinado por você. E coisas sobre força, fé, resignação e coragem foram com a mamãe. Ela é o nosso exemplo e a nossa super heroína, por mais que negue a sua grandiosidade de vez em quando.


Eu li em um livro que um dos maiores sonhos dos irmãos de autistas não-verbais é vê-lo irmão falando. Eu não sei se esse dia vai chegar, mas sei que nós conseguimos entender um ao outro. Você pega no meu braço, geme, olha nos meus olhos e eu já entendo o recado, como se “te entender” fosse algo destinado a nascer comigo. E vice-versa, é a mesma coisa, muitas vezes eu sentei triste e ganhei o seu abraço ou a sua cabeça nos meus ombros porque você já sabia o que eu estava sentindo ou querendo.

Quando éramos pequenos, eu até fazia cara feia para as pessoas que te olhavam de um jeito estranho. Por ficar encarando, já deixei muita gente sem saber o que fazer por causa disso. E quando riram de você, eu briguei, fiquei brava e tirei satisfação. Para mim você sempre foi o cara que metia medo no bicho-papão dentro do quarto, e fora dele era eu quem tinha que meter medo nos bichos-papões da vida real. Nós dois cumprimos muito bem o nosso trabalho, não é? Hoje, no auge do meu 1,80 m., eles podem pensar “Ei, cara, olha o tamanho dela! É a irmã dele!”.

Sempre fomos de ficar na varanda todo final de tarde, se lembra? Mesmo sem falar, você escutava todas as minhas histórias enquanto ficava entretido com as bolhas de sabão na garrafa, o brinquedo que a mamãe inventou e que você nunca mais largou. Víamos o pôr-do-sol e o céu misturando todos os seus tons para virar noite. Dias como aqueles me faziam perceber a importância das coisas simples e sinceras. Você me ensinou a dar afeto e a valorizar as coisas pequenas. Se hoje eu gosto de estrelas e abraços, a culpa é sua.


Nunca sentei para conversar com alguém que tivesse um irmão autista, mas eu sei que esse tipo de pessoa acaba se tornando um ser humano diferente, pois autistas transformam pessoas. Acredito que você é o responsável pelas partes mais bonitas do meu jeito, do meu caráter e da minha alma. Você me abraça sempre que eu te dou banho, limpo o seu prato ou te coloco para dormir e eu acho que é a sua forma de dizer “obrigado”, mas no final das contas sou eu quem tem que agradecer.

Igor, você nunca me defendeu das crianças maldosas e nem dos namorados com defeito. Nunca pudemos sentar juntos e resolver uma questão complicada de matemática ou discutir sobre a melhor faculdade ou a profissão adequada. Mas você sempre ficava ao meu lado enquanto eu brincava de boneca, sempre assistiu filmes comigo e me ensinou a dar carinho. Com você, eu aprendi a ter sentidos, o que faz de mim um alguém sensível o bastante para reconhecer os sentimentos de outras pessoas. Crescer contigo foi aprender o significado de cada pequeno passo. Todo dia nós vivemos e ganhamos algo que vale a pena.

Nunca pude te ouvir dizer que me ama, mas eu sei que sim. Você é quem sempre ficou por perto, sem se incomodar com o que eu estava fazendo, e quem me ensinou que a gente tem sempre que entrar no mundo dos outros para entendê-los. Entrando no seu, eu me tornei alguém melhor. Apesar de você ter autismo, muitas vezes foi você quem não permitiu que eu me isolasse. E para mim, isso é amor.


Obs: esse texto foi originalmente publicado no portal Papo de Homem. Obrigada pela honra, pessoal!


Criei entrebolhasegarrafas.blogspot.com 
para quem tem irmão autista. 
Se quiser conversar, estamos por lá.

12 de junho de 2012

23h12

Era a terceira vez que ela enrolava no trabalho para pegar o ônibus no horário certo. Uma pessoa que anda sempre cansada e usa óculos escuros para esconder o rosto de sono e sem maquiagem, aproveitaria qualquer minuto para ir descansar em casa, dentro do quarto que tem a cara dela, o cheiro dela e a bagunça sempre tão inconfundível que só ela tem.

Eu só sei que essa menina cresceu ouvindo histórias que deram certo - ou até mesmo errado - por causa do acaso da vida. E acredita fielmente que um dia vai tropeçar com esses acasos que trazem sempre uma história bonita para contar. Ela tropeçou uma e perdeu. Chegou a segunda, e ela nada pode fazer, mas sorriu. Chegou a terceira, mas nada aconteceu. E mais uma vez, a garota que era meio poeta estava lá olhando o relógio e achando que poderia escrever a própria história, inventar o próprio enredo e plantar o acaso que finalmente vai fazer ela feliz.

Às vezes a gente pensa que não tem nada de errado deixar algumas coisas passarem, focar os planos ou a vida em um único objetivo e se fechar para um acaso que pode mudar o rumo dos acontecimentos ou até mesmo a uma vida inteira. A gente pensa que pode mudar o destino e decidir o que vamos encontrar no próximo ponto, mas não dá. É o destino quem decide o que vai acontecer conosco, não adianta se esforçar para pegar o mesmo ônibus, no mesmo local ou no mesmo horário. Por mais que você faça planos, a vida já planejou muitas outras coisas para você. Não confie em segundas chances, procure aproveitar as primeiras.

Foi a terceira vez que ela enrolou no trabalho para chegar na hora certa e nada adiantou. Finalmente descobriu que não pode dominar a ordem dos acontecimentos ou provocá-los, e percebeu que não importa quantos carros ela deixe passar ou quanto tempo fique esperando na plataforma, o menino dos olhos bonitos só aparecerá novamente quando o acaso trouxer o ônibus no horário certo de cruzar a história dos dois.

29 de maio de 2012

O dia em que a via láctea me fez chorar

Posso dizer que foi o show da minha vida. E que eu gritei, cantei e pulei daquele jeito exagerado que faz a gente sentir o coração bater forte e a voz não sair mais. Não me permiti fechar os olhos, embora tenha feito isso algumas vezes. Eu não estava acostumada com todas aquelas pessoas me apertando e confesso que é muito difícil ficar na primeira fileira. Várias vezes eu olhei para o segurança e pensei em como ele me tiraria dali, caso eu desmaiasse. 

Fui sozinha, de modo que dividiria qualquer coisa comigo mesma. Organizei minha agenda de um modo em que eu pudesse ligar para algumas pessoas quando a banda tocasse algumas músicas. Eu esperava ligar para umas cinco pessoas durante a parte mais bonita de "Vamos fazer um filme", tudo porque eu mesmo já não sei como é que se diz eu te amo hoje em dia.

"Tempo Perdido" seria o enfoque, já que estou começando a viver agora. Sempre soube que os dias estavam passando, mas nunca tive coragem de chutar o balde e ir passar pelas experiências que eu tinha vontade. Só pelo fato de eu estar ali, vendo Bonfá e Dado tocando juntos, era prova de que temos a nossa própria hora para as coisas da vida. Nem foi tempo perdido, somos tão jovens. Eu acredito muito nisso.

Mas para a minha surpresa. Eu chorei com "A Via Láctea" sendo que eu nunca havia me emocionado com ela. Acabei descobrindo que algumas músicas mexem mais comigo do que eu imaginava. Que Renato Russo é eterno, ninguém pode negar. O cara conseguiu a admiração de uma geração que nem ele mesmo pode conhecer. Ver o Wagner Moura contando que ele escreveu essa música nos seus últimos dias fez todo mundo cantar mais alto. E  o Dado Villa-Lobos deitado no palco olhando para o céu fictício - que nem por isso deixou de ser verdadeiro - só mostrou que nós também estávamos reunidos  cantando para o Renato. E lógico, ela me tocou muito mais fundo por lembrar do meu pai, por ver aquelas estrelas fictíceas ou até mesmo por aquele céu, não sei ao certo.

Problemas técnicos sempre existem. O Wagner Moura deu o melhor de si e viveu o que qualquer fã do Legião sempre teve vontade. Aliás, o que todo fã de Legião sempre fez: cantou junto com o Dado na guitarra e o Bonfá na bateria. A diferença é que dessa vez o Renato não estava no vocal, mas sim no coração. E para falar a verdade, todos nós também estávamos cantando para ele.

O que importa é que eu estive ali com um monte de gente que não pode ver o Legião tocar. Pude perceber o quanto "Teatro dos Vampiros", "Índios" e "Pais e Filhos" são mais bonitas ainda. E tive certeza que o tempo não está perdido. Ontem eu pude fazer tudo isso com músicas que me marcaram a minha infância e que me fazem lembrar dos meus pais. A culpa é toda deles, e eu acho que tenho que agradecer por isso. Aliás, o que eu vou ser quando crescer mesmo?

Acho que aquela que coloca Legião Urbana para tocar aos sábados, e fica fazendo qualquer coisa com os filhos enquanto isso. O tempo nunca estará perdido, nós seremos sempre tão jovens e teremos coisas bonitas para contar.

Força Sempre.