28 de abril de 2013

Chega de Saudade

Tom Jobim nos fez chorar. Não porque era Tom Jobim, não porque conheceu Vinícius, não porque cantou com Elis. Mas porque fez a gente ficar se perguntando se um dia teríamos um sentimento igual ao dele, bem esse que sai do peito e sempre vira algo bonito. 

Ontem, depois daquela lista musical de amores populares brasileiros, eu fui dormir pensando que os caras que sabem mesmo falar de amor são de muito antes. Muito antes de eu nascer, muito antes de Deus fazer você, muito antes de todas as coisas poéticas existentes agora. Não é mais novidade alguma falar de amor, e ainda sim ele continua inspirando o mundo afora. O sentimento está nos olhos, nos poros, nos muros e nas paredes do metrô. As pessoas estão sim cada vez mais dispostas a falar de amor. Você vê? 

Tom Jobim nos fez chorar. Não porque era Tom Jobim, não porque conheceu Vinícius, não porque cantou com Elis. Mas por tocar mais profundo que o Cazuza dizendo que sabia que por toda a vida iria amar. Por compôr os desencontros de Vinicius e usar o sorriso Elis para atestar que todos os caminhos sempre levam ao encontro de nós dois, mesmo que a gente escolha se perder uma, duas, três e mais uma vez depois.

E se você quiser montar o fundo e deixar a sua marca de quem entende a sensibilidade dos acordes sentimentais, coloque o Chico para tocar. Despreze as rimas e escolha o Buarque, porque na terceira ou quarta faixa ele compôs que não há motivos exatos e nem quantidade de tempo para se apaixonar por alguém:"Gostava dela, porque ela era ela e eu era eu". Foi assim, eu te encontrei e aconteceu.

Tom Jobim nos fez chorar exatamente porque era Tom Jobim. Por cantar um álbum inteiro em homenagem ao Vinícius, por chamar Elis para sorrir por todas as pessoas que chegam como uma nova esperança, bem aquelas que aparecem para acabar com uma lembrança ruim.

Porque no final das contas alguns amores só aparecem mesmo para nos amanhecer. Porque um dia a gente entende e se perdoa por gostar de alguém com tamanha facilidade. Porque você, meu amor de bossa nova, foi exatamente o que tinha de ser. Então... chega de saudade.

Letícia Cardoso

7 de abril de 2013

Descobrindo o seu próprio tom


Eu soube o que era um estetoscópio quando tinha sete anos. Na época eu quis ter um só para escutar o coração das pessoas que eu gostava, e acabei não contando para ninguém por algum tipo de medo bobo de todo mundo estranhar. Nenhuma criança da minha sala havia pedido um estetoscópio de Natal, então eu deixei esse desejo de lado e durante um bom tempo fui dormir imaginando como seria o som do coração do meu irmão.

Dia desses eu lembrei dessa vontade quando pensei que se eu fosse médica, eu seria cardiologista. Se eu fosse cirurgiã, optaria por consertar corações. Hoje sou jornalista, e não tenho dúvida alguma de que essa minha mania de escrever sobre sentimentos tem a ver com o fato de que um dia eu quis um estetoscópio só para escutar corações.

E de repente me bateu aquele desejo de infância de novo. Eu quis sair do trabalho e ir diretamente comprar um estetoscópio. Eu quis bater no quarto do meu irmão e finalmente saber como é o som do coração dele. Eu quis colocar o aparelho no peito e ver se há alguma diferença nas minhas batidas quando eu penso em determinadas coisas, e se isso me ajudaria a fazer boas escolhas. Eu quis me apaixonar por alguém e escutar o coração dessa pessoa apenas deitando a cabeça no peito dela, porque eu acredito de verdade que amar alguém também é saber escutar o coração dela sem aparelho algum e com todos os barulhos existentes no mundo.

Não sei se vendedores de estetoscópio pedem algum tipo de satisfação, mas e se o vendedor da loja estranhasse o meu pedido? E se ele me olhasse estranho quando eu dissesse "sim moço, é só pra saber o som do meu e do coração das pessoas que eu gosto"? Talvez nós dois ficaríamos dentro de algum tipo de silêncio incômodo durante os segundos em que ele me julgaria com o olhar, sem saber se é certo ou não me entregar o aparelho que ele segura firmemente com a mão direita. E durante esse tempo eu  me perguntaria se o vendedor já teve o seu coração escutado, se ele tem noção do que significa alguém querer escutar o seu e se ele acha bobo uma adulta formada em humanas querer um aparelho médico para essa finalidade. É estranho escutar o coração hoje em dia?

Na mais leve das hipóteses, ele riria da minha cara achando tudo aquilo meio bobo e eu fosse embora com a consciência de que é um pouco bobo sim, mas é uma coisa tão minha que ninguém tem nada a ver com isso. Hoje em dia eu sei que não tem problema algum pedir um presente de Natal diferente das outras crianças da classe, e ficarei contente se meus filhos descobrirem isso rapidamente. Se leva um bom tempo para perceber o quão pode ser bonito todas as coisas bobas, tolas e tão nossas.

E na hipótese mais otimista e simplista da minha história com o vendedor, ele seria simpático e falaria que outros clientes já haviam comprado um estetoscópio com a mesma finalidade. Que a venda do aparelho naquela semana havia sido baixa, por causa de uma remessa com defeito que foi entregue pelo fabricante. Os noticiários não estavam veiculando, mas parte da população andava com dificuldades de escutar os batimentos cardíacos das pessoas que elas amavam, porque uma das máquinas havia sido limpa com um teor mais alto de soda cáustica, o que atinge diretamente a captação dos sons graves dos aparelhos.

Então eu fecharia o pedido sabendo que não é preciso ser estudante de medicina, ter pressão alta ou estar doente para comprar um estetoscópio. Eu pagaria pelo meu aparelho rapidamente no caixa e iria para casa sabendo que os sons nunca serão os mesmos, porque um coração que sente afeto pela gente, ou é amado pelo nosso, sempre "toca" de um jeito diferente dos outros.

Talvez seja por isso que eu sempre quis um estetoscópio: em uma realidade palpável, eu conseguiria escutar o "toque único" existente dentro de cada um. Todos nós temos um tom próprio, e por mais que pareça bobo, eu me pergunto: quem estará disposto a escutar o nosso?

Letícia Cardoso

1 de abril de 2013

6.999.999

Sete bilhões de pessoas no mundo e você sente falta de uma que ainda nem conheceu.